Os hemocentros desempenham um papel fundamental no setor de saúde. Mas não é raro ver essas instituições com estoques abaixo do necessário. A situação tende a piorar nos meses de inverno e em feriados prolongados, quando cai a frequência das doações. Isso acaba pondo em risco a saúde de pacientes que precisam de transfusão. As campanhas de incentivo à doação de sangue ajudam a contornar o problema, mas não são suficientes.

Na prática, o ato precisa se tornar um costume da população. E os médicos podem ajudar no processo de conscientização.

O Dia Nacional do Doador Voluntário de Sangue, comemorado em 25 de novembro, é o ponto alto dessa mobilização. E ela é mais do que necessária. A quantidade de doações tem se mantido estável nos últimos anos, segundo o Ministério da Saúde (MS). Em 2017, por exemplo, 3,4 milhões de bolsas de sangue foram coletadas em 2017 e 2,8 milhões transfusões foram feitas.

A doação de sangue espontânea soma 66% do total. Mas deveriam representar 100%, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). “O doador voluntário aumenta a qualidade do produto que a gente oferece, pois conseguimos monitorá-lo”, justifica Yêda Maia de Albuquerque, presidente da Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco (Hemope), em entrevista à BBC Brasil.

Uma pesquisa realizada para guiar a criação do Doe-se, aplicativo que estimula a ida aos hemocentros, apontou que as campanhas poderiam ser mais efetivas se incentivassem não a doação pontual, mas a regularidade do ato. A falta de conscientização, a cultura e a desinformação prejudicam a concretização desse objetivo.

É aí que entra a classe médica. Ela é uma das aliadas na reversão dessa realidade, ao esclarecer dúvidas e desmistificar crenças erradas entre os cidadãos.

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Mitos comuns sobre a doação de sangue

Transfusão de sangue pode transmitir doenças

Além dos 400 a 450 ml destinados à doação, também são coletadas amostras para testar a ocorrência de doença de Chagas, Vírus T-Linfotrópico Humano (HTLV) e sífilis. O risco de contaminação também diminuiu a partir da obrigatoriedade da realização do Teste de Ácidos Nucléicos (Nat), que detecta os vírus HIV e das hepatites B (HBV) e C (HCV). No entanto, ainda há chance de contaminação devido à janela imunológica, mesmo que reduzida: de 21 para 9 dias (HIV), 32 para 15 (HBV) e 56 para 7 (HCV).

Qualquer pessoa pode doar sangue

Não é totalmente verdade. Os doadores devem se encaixar nos seguintes critérios:

Ter entre 16 e 70 anos (jovens entre 16 e 18 anos precisam do consentimento dos pais ou responsáveis legais);
Estar em bom estado de saúde;
Peso superior a 50 kg;
Ter dormido bem na noite anterior à doação;
Não estar em jejum;
Não ter ingerido bebida alcóolica nas últimas 12 horas;
Não fumar, no mínimo, 2 horas antes e depois da doação;
Não ter ingerido alimentos gordurosos recentemente;
Não estar grávida nem ter feito parto normal nos últimos 90 dias ou cesariana nos últimos 180;
Não ter feito tatuagem ou colocado piercing nos últimos 12 meses;
Não ter estado sujeito a situações que apresentam risco de contágio de infecções sexualmente transmissíveis nos últimos 12 meses;
Não ter tido hepatite após os 11 anos de idade;
Não ter malária, doenças associadas aos vírus HTLV I e II e Doença de Chagas e/ou estar infectado com os vírus do HIV e das hepatites B e C;
Não fazer uso de drogas injetáveis ilícitas.

Homens e mulheres podem doar quantas vezes desejarem

Não é bem assim. Homens podem realizar doação de sangue a cada três meses, enquanto as mulheres, a cada quatro.

Quando a transfusão de sangue é necessária?

Normalmente, a transfusão de sangue utiliza apenas um dos componentes do material, de acordo com a necessidade e o tipo sanguíneo do paciente. Glóbulos vermelhos, plaquetas e plasma são os únicos que podem passar pelo processo. A transfusão é necessária nos seguintes casos:

Sangramentos intraoperatórios superiores a 500 ml ou causados por ferimentos;
Hemorragias durante a gravidez ou o parto;
Reposição de proteínas da coagulação;
Doenças hematológicas: talassemia, anemias e doença falciforme;
Cânceres: linfomas (leucemia mieloide aguda ou crônica), mieloma múltiplo, mielóide e mielodisplasia;
Doenças do metabolismo;
Doenças autoimunes.

A doação de sangue torna-se ainda mais relevante no tratamento de doenças sanguíneas, que, principalmente no início, exigem transfusões quase diárias de hemácias e plaquetas. O procedimento é dispensado apenas quando a medula óssea retoma a normalidade da hemopoese (produção e maturação das células do sangue).

Antes de qualquer transfusão, o médico deve esclarecer todas as dúvidas do candidato acerca do procedimento em si, além de possíveis riscos, como a reação transfusional. A indicação do procedimento também pode ser avaliada por um hemoterapeuta.

A requisição de transfusão, além de mencionar os dados pessoais do paciente (peso, idade, etc), deve incluir o diagnóstico e os resultados de exames laboratoriais que justifiquem a realização do procedimento. O médico ainda indica o tipo de transfusão (programada, não urgente, urgente e de extrema urgência) e outras características mencionadas no Manual de Transfusão Sanguínea para Médicos, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu.

Transplante de medula óssea

As células-tronco hematopoéticas, que produzem sangue, são o componente utilizado para o transplante de medula óssea, necessário para o tratamento de cerca de 80 doenças, como anemias e linfomas. O objetivo é “substituir” o tecido doente por um sadio.

Basta uma coleta de sangue tradicional para analisar a compatibilidade entre doador e receptor. Atualmente, quase 5 milhões de doadores estão cadastrados no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome) – ligado ao Instituto Nacional de Câncer (Inca). Ao todo, 805 pessoas aguardam receber uma doação.

Além da doação de sangue (por meio de aférese ou de uma pequena cirurgia com anestesia), a coleta de células precursoras de medula óssea a partir do cordão umbilical do paciente ou de terceiros também é uma alternativa. O artigo 9º-A da Lei 9.439/97 define que a mãe deve ser informada no período pré-natal ou no parto sobre a possibilidade de doar o material para um banco público. Uma delas é a Rede BrasilCord, conveniada a maternidades país afora.

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