Espirometria de incentivo: aplicações e técnicas na prática fisioterapêutica

A espirometria de incentivo é uma técnica amplamente utilizada na fisioterapia respiratória para estimular a expansão pulmonar e prevenir complicações respiratórias, como atelectasias e infecções pulmonares. O método envolve o uso de um dispositivo que fornece um feedback visual ao paciente, incentivando inspirações profundas e controladas. Esse mecanismo auxilia na reexpansão pulmonar, melhora a ventilação alveolar e promove a higiene brônquica.
Na fisioterapia, a espirometria de incentivo é indicada principalmente no pós-operatório de cirurgias torácicas e abdominais, em pacientes acamados e em indivíduos com doenças pulmonares crônicas, como DPOC e fibrose pulmonar. Seu uso regular contribui para a melhora da mecânica respiratória e da capacidade funcional, sendo essencial na reabilitação pulmonar.
Existem dois tipos principais de espirometria de incentivo: a volumétrica, que mede a quantidade de ar inspirado, e a de fluxo, que avalia a velocidade do fluxo respiratório. A escolha do dispositivo depende das necessidades do paciente e dos objetivos terapêuticos. Além disso, a técnica deve ser supervisionada por um fisioterapeuta para garantir uma execução correta e segura, otimizando seus benefícios.
Indicações da espirometria de incentivo
A cirurgia cardíaca é um procedimento frequente e pode apresentar alto risco de complicações. O cuidado da função ventilatória pode reduzir desfechos negativos e complicações pulmonares. A espirometria de incentivo (EI) é uma técnica de exercício respiratório de baixo custo, usada para prevenção e tratamento de complicações pulmonares pós-operatórias através da manutenção da permeabilidade alveolar e melhora dos volumes pulmonares em pacientes. A aplicação serve tanto para condições agudas, crônicas, como para a doença pulmonar obstrutiva crônica, ou no período pós-cirúrgico.
Em recente ensaio clínico randomizado (66 participantes; grupo de respiração profunda = 32 e grupo controle = 34) foi aplicado exercícios de respiração profunda com um espirômetro de incentivo no período pré-operatório. Os resultados demonstraram que a incidência de complicações pulmonares pós-operatórias foi de 3,1% no grupo intervenção e de 23,5% (p < 0,05) nos controles. O tempo de ventilação mecânica, tempo de internação hospitalar e tempo de internação na unidade de terapia intensiva foram significativamente menores no grupo de respiração profunda (p < 0,05) além de maiores valores na saturação de oxigênio no pós-operatório.
O uso de espirômetro de incentivo na oxigenação pós-operatória e complicações pulmonares após cirurgia de revascularização do miocárdio foi objeto de investigação em outro ensaio clínico randomizado. Um total de 89 pacientes foram randomizados e o grupo intervenção realizou espirometria de incentivo a cada duas horas por 48 horas após a extubação, enquanto o grupo controle seguiu o cuidado padronizado. Pacientes no grupo de intervenção tiveram um número médio significativamente menor de eventos hipóxicos com menor duração e menor tempo de internação no hospital e na UTI. Pacientes no grupo de intervenção também apresentaram maior volume expiratório forçado pós-operatório em 1 segundo.
Outra condição em que pode ser usada a espirometria de incentivo é na substituição de válvula cardíaca. Em um estudo que teve como objetivo comparar os efeitos da respiração diafragmática, espirometria orientada a fluxo e a volume, 29 pacientes após cirurgias de substituição de válvula foram aleatoriamente designados para as diferentes modalidades. Os pacientes passaram por treinamento pré-operatório e reabilitação de sete dias após a cirurgia. Os valores do teste de função pulmonar reduziram em todos os três grupos no pós-operatório quando comparados aos valores pré-operatórios, mas melhoraram no sétimo dia pós-operatório (p < 0,05). Ao comparar os valores do sétimo dia pós-operatório com os valores pré-operatórios, o grupo que realizou espirometria a volume retomou os valores da capacidade vital forçada. Neste estudo, o espirômetro orientado a volume foi considerado o mais benéfico entre as três técnicas na melhoria da função pulmonar dos pacientes e nas tarefas funcionais da vida diária.
No entanto, em uma revisão sistemática de ensaios clínicos totalizando 1.677 participantes, foi demonstrado que a espirometria de incentivo não é superior ao tratamento respiratório padrão para complicações pulmonares pós-cirúrgicas. Em outra revisão sistemática com metanálise sobre o uso da espirometria de incentivo após cirurgia cardíaca, torácica e abdominal, foram incluídos 31 ensaios clínicos randomizados totalizando 3,776 adultos submetidos a cirurgia cardíaca, torácica ou abdominal. O estudo mostrou que a espirometria de incentivo sozinha provavelmente resulta em pouca ou nenhuma redução no número de pacientes adultos com complicações pulmonares, na mortalidade ou nos dias de intenação após cirurgia cardíaca, torácica e abdominal superior.
Benefícios da espirometria de incentivo
A espirometria de incentivo é uma técnica utilizada para promover a expansão pulmonar e melhorar a mobilidade diafragmática, especialmente em pacientes pós-operatórios, acamados ou com comprometimento ventilatório. Seu mecanismo fisiológico baseia-se no princípio da inspiração sustentada máxima, que estimula a ventilação pulmonar eficiente.
Durante o uso do dispositivo, o paciente realiza uma inspiração profunda e sustentada, aumentando o volume corrente e promovendo a recrutamento alveolar. Isso reduz o risco de atelectasia ao melhorar a ventilação alveolar homogênea e a distribuição de gases. O aumento da pressão transpulmonar também favorece a reabertura de unidades alveolares colapsadas, otimizando a relação ventilação/perfusão.
Além disso, a espirometria de incentivo estimula a mobilidade do diafragma que é o músculo responsável majoritariamente pela fase inspiratória. A literatura carece de informações sobre o fortalecimento diafragmático, no entanto, a espirometria de incentivo melhora a sua excursão e reduz o trabalho respiratório incentivando o uso da respiração diafragmática eficaz.
Com o uso regular, a técnica melhora a complacência pulmonar, facilita a remoção de secreções e contribui para a reabilitação respiratória, prevenindo complicações como pneumonia e hipoventilação pulmonar.
Técnicas e estratégias para aplicação da espirometria de incentivo
O uso adequado envolve inspirações lentas e profundas, garantindo a expansão máxima dos pulmões. O paciente deve ser orientado a realizar de 10 a 15 repetições por série, conforme tolerância, inspirando pelo bocal do dispositivo e mantendo os indicadores na faixa recomendada com 5 – 10 séries. Alguns estudos já realizaram intervenções a cada duas horas até 2x/dia.
Existem dois principais tipos: fluxo e volume. No espirômetro de fluxo, o objetivo é manter as esferas suspensas, enquanto no de volume, o paciente deve atingir a meta volumétrica prescrita. É essencial que a expiração seja passiva e controlada. Para maximizar os benefícios, a técnica deve ser combinada com exercícios de tosse assistida e mobilização precoce, garantindo uma melhor oxigenação e recuperação pulmonar. A adesão ao protocolo é fundamental para a eficácia da terapia.
Conclusão
O uso da espirometria de incentivo deve ser individualizado, com base nas evidências sobre a população de interesse e na disponibilidade de equipamentos dos serviços, Ainda, a literatura ainda carece de estudos mais bem definidos metodologicamente para sustentar o uso nos diferentes contextos.