Dores, desconfortos, perda de força e até mesmo casos mais sérios – como fraturas ou lesões ligamentares – podem ser tratados com terapia manual. Além de atuar na prevenção, a técnica terapêutica também é utilizada no tratamento e na manutenção da saúde musculoesquelética.

Definida pela fisioterapia traumato-ortopédica como uma subespecialidade, a terapia manual atende por outra denominação em outros países. Fora do Brasil, ela atende pela versão traduzida de “fisioterapia manipulativa ortopédica”. A modalidade vale-se de recursos manuais para manejo de condições clínicas neuromusculoesqueléticas, contemplando articulações, músculos, fáscia e sistema nervoso periférico.

“Os recursos terapêuticos manuais permitem ao fisioterapeuta avaliar e sentir melhor os movimentos e a qualidade deles, assim como a melhor palpação dos tecidos musculoesqueléticos”, explica o fisioterapeuta Francisco de Araujo, mestre em Ciências da Reabilitação pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

A abordagem é encarada de maneira positiva pela maioria dos pacientes, que se sentem mais confortáveis diante das técnicas manuais. A não obrigatoriedade de terapia medicamentosa também contribui nesse sentido. Entretanto, vale lembrar, o método manual não deve ser utilizado de modo prioritário em fases mais avançadas da reabilitação.

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Evolução e investigação

O diagnóstico fisioterapêutico é feito em etapas e se difere da análise médica comum, geralmente vinculada a alterações ou lesões estruturais – como hérnia de disco ou lesão do menisco. Mas é a função (ou a perda dela) que acaba pesando na hora da avaliação. “Eu posso ter dez pacientes com o mesmo diagnóstico médico e cada um deles apresentar um quadro clínico diferente, com incapacidades diferentes”, observa Araujo.

Na primeira etapa do diagnóstico é feita a anamnese, a fim de que o fisioterapeuta consiga reunir informações sobre o paciente e anote suas queixas. Em seguida, o profissional inicia uma série de testes para identificar a origem do incômodo.

Aliando questões biológicas, psicológicas e sociais com raciocínio clínico adequado, o fisioterapeuta realiza o diagnóstico mais adequado para cada caso. A partir desse somatório de informações, e considerando as preferências e expectativas do paciente, ele determina quais serão os procedimentos e as técnicas mais adequadas para cada tecido. Em muitos casos, a terapia manual se revela a melhor alternativa.

Confira, a seguir, uma entrevista com Francisco de Araujo:

Sabemos que procedimentos da fisioterapia contribuem para prevenção, cura e recuperação de disfunções do sistema musculoesquelético. Você poderia nos falar um pouco mais o que é, como funciona e principalmente qual a importância da fisioterapia para esses tipos de tratamento? O que difere o uso desses recursos fisioterapêuticos dos demais?

Dentro da especialidade de fisioterapia traumato-ortopédica, uma subespecialidade é chamada de fisioterapia manipulativa ortopédica. Esse é o termo reconhecido internacionalmente, embora aqui no Brasil com frequência ela seja denominada terapia manual. Isso ocorre porque o termo manipulativa pode dar a entender que se trata apenas do uso de técnicas chamadas de manipulação – o que não é correto. Essa subespecialidade, portanto, aborda diversos recursos manuais (não apenas manipulação) tanto para a avaliação quanto ao tratamento de diferentes condições clínicas neuromusculoesqueléticas. Esses recursos podem ser endereçados às articulações, músculos, fáscia e inclusive ao sistema nervoso periférico. Os recursos terapêuticos manuais permitem ao fisioterapeuta avaliar e sentir melhor os movimentos e a qualidade deles, assim como a palpação dos tecidos musculoesqueléticos. As informações são parte importante do processo avaliativo. Além disso, o contato com o paciente é fundamental na aliança terapêutica, pois muitas vezes eles se sentem mais seguros e confortáveis. Essas técnicas apresentam efeitos positivos, chamados de mecânicos, e efeitos neurofisiológicos, como a analgesia sem necessidade de ingerir medicamentos. No entanto, eles são mais importantes numa fase inicial do tratamento, e não devem ser prioritários em etapas avançadas da reabilitação – uma vez que o paciente precisa se tornar independente o quanto antes. Assim, exercícios realizados de forma autônoma e exercícios que o paciente possa fazer em casa são fundamentais para o sucesso do tratamento.

A quem se destina a fisioterapia traumato-ortopédica e onde ela pode ser aplicada?

A qualquer paciente que apresente alguma condição neuromusculoesquelética. São pacientes que necessitam desde a reabilitação de traumas importantes – fraturas, cirurgias ou lesões ligamentares – até condições mais simples – dores, desconfortos, perda de força ou de amplitude de movimento articular. A fisioterapia traumato-ortopédica tem como locais de atuação hospitais, postos de saúde, ambulatórios, clínicas, consultórios e clubes esportivos, além de empresas (área ergonômica) e centros de pesquisa. Ela atua tanto na prevenção, avaliação e tratamento destas condições.

Para que o fisioterapeuta defina quais serão os procedimentos utilizados na hora do tratamento, como é feito o diagnóstico do paciente?

Primeiramente, o diagnóstico fisioterapêutico é diferente do diagnóstico médico. O diagnóstico médico geralmente está atrelado a alguma alteração ou lesão estrutural (por exemplo, hérnia de disco, ruptura de ligamento, lesão do menisco etc.). Para o fisioterapeuta, essa informação também é importante, mas, mais do que isso, é a função (ou perda da função) do paciente que nos importa. Dez pessoas com o mesmo diagnóstico médico podem apresentar dez quadros clínicos diferentes e dez incapacidades diferentes. Assim, o diagnóstico fisioterapêutico é feito por etapas. Através da anamnese, o fisioterapeuta recolhe as informações importantes do paciente e de suas queixas. Em seguida, ele realiza uma série de testes que o auxiliam a tentar identificar a causa (ou estrutura) responsável pelo problema. Cabe ao fisioterapeuta entender o quanto esta condição afeta na função e qualidade de vida específica do paciente. Esse somatório de informações, aliando questões biológicas (tecidos lesionados ou não), psicológicas e sociais, com raciocínio clínico adequado, permitirão realizar um diagnóstico adequado. A partir daí, baseado nas evidências científicas disponíveis, na sua experiência clínica e nas preferências e expectativas do paciente, o fisioterapeuta determina quais os procedimentos mais adequados. Em muitos casos, mas não todos, os recursos da terapia manual são uma boa abordagem.

Quais seriam esses recursos? Você poderia falar um pouco mais sobre eles?

Existem, portanto, técnicas da terapia manual aplicadas às articulações chamadas de mobilizações articulares e também as manipulações articulares. Assim como técnicas de mobilização ou liberação miofascial (endereçadas aos músculos e fáscias). Por último, as técnicas de mobilização ou deslizamento dos nervos. A partir do diagnóstico fisioterapêutico, do raciocínio clínico adequado, e baseado em evidências científicas, o fisioterapeuta escolhe qual técnica (e para qual tecido) deve ser escolhida. Cada uma delas apresenta efeitos diversos, mas de forma geral têm o objetivo de reestabelecer a função normal deste tecido e consequentemente reestabelecer a função normal do paciente.

A fisioterapia e seus recursos não servem apenas na hora da cura, mas também na prevenção. Como ela pode funcionar de maneira preventiva?

Assim como as demais áreas da saúde, a fisioterapia tem um papel importante na prevenção de doenças. Infelizmente, com frequência, nós fisioterapeutas pecamos neste quesito – ou por excesso ou por carência. A prevenção adequada se faz diminuindo ou evitando fatores de risco de determinada condição. Fatores de risco são determinados apenas com estudos científicos de acompanhamento de longo prazo. Porém, com frequência, consideramos fatores de risco situações que não foram estabelecidas em estudos científicos e sim pelo senso comum e conhecimento popular. Além disso, pessoas saudáveis, sem sintomas, não precisam necessariamente consultar um fisioterapeuta periodicamente para se manterem saudáveis e prevenirem lesões. A prevenção se faz com medidas educacionais capazes de atingir uma população maior. Por exemplo, um dos problemas mais comuns da população mundial é a dor lombar. Medidas de prevenção para este problema não são ir ao fisioterapeuta semanalmente, ou mensalmente ou anualmente – caso não tenha nenhum sintoma. Prevenção para dor lombar, a partir de estudos científicos adequados, é manter-se ativo e realizar alguma atividade física regular. Essa educação é a forma adequada de prevenir. Assim como para outras situações de saúde. Podemos fazer uma analogia com a área médica: as pessoas não precisam ir regularmente ao pneumologista para prevenir câncer de pulmão. A informação existente é que fumar é prejudicial à saúde e, portanto, evitar o cigarro é a forma adequada de prevenção.

Conheça um pouco mais sobre outras técnicas de terapia manual:

Mobilização neural ou neurodinâmica: técnica utilizada para casos em que a fonte de dor é o tecido neural. Consiste em um conjunto de manobras que provocam deslizamentos no trajeto dos nervos, liberando pontos de compressão ou tensão.

Mobilização articular: é usada geralmente para modular a dor e tratar disfunções articulares que limitam a amplitude de movimento. Para a mobilização articular, é preciso que o fisioterapeuta tenha conhecimento de anatomia, artrocinemática, osteocinemática e dos mecanismos neurofisiológicos musculoesqueléticos.

Conceito Maitland: avalia e trata disfunções articulares tanto da coluna vertebral quanto de articulações periféricas. A principal característica do método é o alívio imediato de sintomas, além de melhora na amplitude de movimento por meio de mobilizações e manipulações que visam analgesia, facilitação neuromuscular, estimulação do retorno venoso e relaxamento de músculos adjacentes, entre outros.

Conceito Mulligan: restaura o alinhamento articular e normaliza o eixo de movimento. Diferentemente das outras abordagens, a principal característica da técnica é a ausência de dor durante a sessão de tratamento. As correções são aplicadas através da combinação da mobilização articular, feita pelo fisioterapeuta, com o movimento ativo, realizado pelo paciente – tudo sem nenhuma dor.

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