O Brasil tem o terceiro maior banco de doadores de medula do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da Alemanha. Em 2020, em função da pandemia, o país registrou queda de 25,82%, no transplante de medula óssea, caindo de 2.130 em 2019 para 1.580. A esse problema soma-se o risco de desabastecimento do medicamento Bussulfano, essencial ao procedimento.

O fármaco é uma solução injetável distribuída pelo laboratório francês Pierre Fabre. Em novembro de 2020, a empresa anunciou que deixaria de comercializar o remédio no país, pois encerrou suas atividades. Com isso, estima-se que o estoque do medicamento por aqui seja suficiente para uso até junho, apenas.

O transplante de medula óssea é a única possibilidade de cura para mais de 70 doenças hematológicas. A diferença deste para outros transplantes de órgãos sólidos é que, antes do procedimento, é necessário fazer um pré-condicionamento – em que o medicamento atua destruindo células doentes e preparando o organismo para receber a nova medula.

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O que diz a Anvisa

Em dezembro de 2020, a Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) encaminhou um ofício à diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) solicitando esclarecimentos quanto ao desabastecimento de Bussulfano. Conforme a Anvisa, não há “instrumento legal que impeça os laboratórios farmacêuticos de retirarem seus medicamentos do mercado”.

O Busilvex®, na prática, pertence à empresa Otsuka Pharmaceutical. Por meio de um acordo comercial, a Pierre Fabre adquiriu direitos de licenciamento para registro e distribuição do medicamento na Europa e América Latina, sendo a filial brasileira a detentora do registro no país. Como não possui a droga em seu portifólio original, torna-se inviável a produção do medicamento.

Diante da iminência do desabastecimento, a Anvisa autorizou a importação do medicamento em caráter excepcional. No entanto, por questões comerciais, não foi possível realizar a transação.

Em entrevista ao portal GZH, Fernando Barroso, diretor da Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (SBTMO), defende a criação de políticas públicas para evitar que o fornecimento de remédios seja comprometido por oscilações do mercado – como essa. “Nós acreditamos que é preciso haver uma normatização ou uma nova legislação que permita que o governo ou órgão competente fique responsável, ou possa fazer a importação ou permita que haja registro de um outro Bussulfano no nosso país”.

A Anvisa informa haver um acerto para o encaminhamento de uma solicitação emergencial. Segundo apuração de GZH, além da solicitação feita à Anvisa para a importação de medicamento suficiente para abastecer o mercado por mais um ano, considera-se a autorização definitiva para que outro laboratório assuma a distribuição do fármaco. Nesse caso, a empresa indicada seria a a Accord Farma, que confirmou as negociações por meio de nota à reportagem de GZH.

Outros entraves para o transplante de medula no Brasil

Segundo o governo federal, a chance de um paciente encontrar uma pessoa compatível é de uma em 100 mil. Além disso, a maioria dos inscritos no registro de doadores de medula óssea são das regiões Sul e Sudeste, e é preciso uma maior variedade de perfis genéticos para haver maiores chances de compatibilidade. As informações são da Agência Brasil.

Para complicar esse cenário, há ainda um entrave de ordem étnica. Realizado por cientistas ligados à Universidade de São Paulo e ao Instituto Nacional do Câncer, o estudo Como a ancestralidade influencia as chances de encontrar doadores não relacionados: uma investigação em brasileiros mistos revela que afrodescendentes têm cerca de 60% menos chances de encontrar um doador no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome) do que pessoas com ascendência europeia.

A pesquisa aponta ainda que “esse cenário pode ser crítico no caso de populações mistas, que traçam sua ancestralidade em diferentes regiões geográficas, e tem sido o foco de vários estudos recentes sobre como a etnia influencia a probabilidade de encontrar um doador”. O contexto acaba sendo crítico para o Brasil, já que, segundo o IBGE, 56,1% da população se declara negra – o que inclui pretos e pardos.

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