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Bacteriúria assintomática: definições e indicações de tratamento

Infecções do trato urinário são caracterizadas pela presença de bactérias no trato urinário, acompanhada de sintomas. É crucial observar que a mera detecção de bactérias na urina não é suficiente para satisfazer essa definição, sendo, portanto, inadequada a categorização como uma infecção.

Em função disso, utilizaremos o termo bacteriúria assintomática (e não infecção urinária assintomática) neste artigo. Além disso, é importante destacar que gestantes estão excluídas desta classificação, uma vez que há aumento de risco de abortamentos com a presença de bactérias na urina na gestação, assim existem recomendações de manejo específicas para estas pacientes.

A bacteriúria assintomática é um evento comum e sua prevalência é influenciada por fatores individuais. Sexo feminino, idade, diabetes, lesões neurológicas, hemodiálise e uso de cateteres urinário de longa permanência aumentam o risco deste evento. 

Neste artigo, você vai ver como se define este evento, os motivos para não se realizar tratamento de forma rotineira, bem como situações de exceção em que o tratamento deve ser considerado mesmo na ausência de sintomas.

O que é bacteriúria assintomática?

Se define bacteriúria assintomática pela ausência de sintomas e cultura de urina positiva com os seguintes pontos de corte:

  • ≥ 10⁵ unidades formadoras de colônia de uma mesma bactéria em duas coletas consecutivas (dentro de 2 semanas) de urina de jato médio em mulheres;
  • ≥ 10⁵ unidades formadoras de colônia de uma única bactéria em uma única coleta de urina de jato médio em homens e pessoas utilizando sonda urinária de longa permanência (sonda vesical de demora, cistostomia);
  • ≥ 10² unidades formadoras de colônia de uma única bactéria em uma única coleta de urina por cateterização urinária.

Talvez o aspecto mais importante da definição de bacteriúria assintomática é a definição de ausência de sintomas atribuíveis a uma cultura de urina positiva - especialmente em idosos. Cistite não complicada e pielonefrite tem manifestações relativamente fáceis de identificar. 

Por outro lado, em idosos é comum se atribuir à infecção urinária quadros de delirium, declínio cognitivo recente, quedas e perda de funcionalidade. Nesses pacientes, quando não há febre, sinais de sepse ou outras manifestações locais que indiquem acometimento do trato urinário, deve se ter um alto limiar para atribuir à infecção urinária sintomas inespecíficos: a recomendação geral é optar por observação e não tratamento antimicrobiano. 

Talvez a melhor abordagem nestes pacientes é evitar a solicitação de exame de cultura de urina. Já quando houver sinais de sepse ou choque séptico, deve-se considerar também outros focos de infecção (pulmão, pele, etc), mas incluir na cobertura antimicrobiana germes do trato urinário.

Pacientes com doenças neurológicas acometendo o sistema urinário também são outro grupo de difícil avaliação. Frequentemente esses indivíduos têm comprometimento da sensibilidade da região, o que limita e investigação de sintomas. Na falta de outra explicação, febre, piora da espasticidade e mal-estar podem ser atribuídos a infecção urinária e o tratamento deve ser considerado.  

Uma observação adicional é que a presença de piúria (manifestada por leucocitária, urina turva ou com pus visível) é comum e não é indicação de tratamento.

Por que não tratar pacientes com bacteriúria assintomática

Rotineiramente, não deve-se tratar pacientes com bacteriúria assintomática. Essa recomendação baseia-se em vários fatores. 

O primeiro é a ausência de benefício, ou seja, o tratamento desses pacientes não reduz a frequência de infecção urinária sintomática ou mesmo complicações. Mesmo que maioria dos pacientes apresentem negativação da cultura de urina com o tratamento, metade deles volta a ter bactérias na urina em pouco tempo. 

O segundo fator, favorecendo o não tratamento, é que trata-se de uma situação com evolução benigna, com baixa taxa de desenvolvimento de sintomas e que não aumenta o risco de eventos graves (insuficiência renal, morte). Essa benignidade da evolução sem tratamento parece ser verdade mesmo para pacientes imunossuprimidos. 

Em função desses dois fatores, a prevalência de cultura de urina positiva após um ano é muito semelhante entre pessoas com bacteriúria assintomática que realizaram e não realizaram tratamento.

Adicionalmente, deve-se lembrar do risco de efeitos adversos e custos dos antimicrobianos. Seleção de bactérias mais resistes também é uma das consequências adversas de tratamento excessivo com antibióticos. 

Por fim, mesmo em populações mais sucetíveis, como idosos, pessoas com diabetes mellitus, pacientes que irão colocar material protético (por exemplo, prótese de quadril) ou usuários de cateter urinário em longo prazo, não se recomenda tratamento antimicrobiano.

Quando tratar: casos selecionados

Existem algumas poucas indicações de tratamento para pessoas sem sintomas com identificação de bactérias no trato urinário:

  • Gestantes:
     nos casos de cultura de urina positiva (10⁵ unidades formadoras de colônia, idealmente confirmado em 2 exames), deve-se realizar tratamento antimicrobiano. Essa recomendação se baseia na redução do risco de pielonefrite e de baixo peso nos recém nascidos de mães tratadas, além de potencialmente reduzir o risco de abortamentos. Deve-se tratar com antibiótico compatível com a gestação e pelo menor tempo possível. Beta-lactâmicos, nitrofurantoína e fosfomicina são as principais opções.
  • Procedimentos urinários:
     pessoas que irão realizar procedimento cirúrgico com risco de sangramento em mucosa. Por exemplo, em pacientes que irão para ressecção transuretral de próstata, o uso de antibiótico reduz a chance de bacteremia e infecção urinária no período pós-operatório.
  • Transplante renal:
     trata-se de uma indicação questionável, pois existe incerteza do benefício. O racional de monitorar e tratar infecção urinária assintomática no período pós-transplante imediato é tentar reduzir o risco de rejeição de enxerto. Muitos centros não realizam mais essa conduta por falta de estudos que a embasem. Entretanto, quando ela for utilizada, deve ser feita apenas nos primeiros 1-2 meses pós-transplante. Nesses casos, quando a cultura de urina vem positiva, deve-se repetir a cultura para documentar a persistência do mesmo germe em um segundo exame e, se houver mais de 10⁵ unidades formadoras de colônia, procede-se o tratamento guiado por antibiograma por 5 dias.