Cuidados de enfermagem ao paciente com dor crônica

A dor é definida pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) como “experiência sensorial e emocional desagradável, associada a lesões reais ou potenciais ou descrita em termos de tais lesões”.
Sua classificação pode ocorrer em dois tipos: aguda, com causa conhecida e duração limitada, e crônica, quando dura mais de três meses, com causa desconhecida ou mal definida. A sintomatologia crônica traz uma desordem no cotidiano das pessoas e pode haver perda da esperança de melhora, invalidez, imagem corporal alterada e queda da autoestima.
Na cronicidade, podem surgir problemas psicológicos, disfunção cognitiva, mudança de comportamento, redução da capacidade física, com diminuição da produtividade nas tarefas de casa e do trabalho e, com efeito, provocar um impacto econômico que reduz a qualidade de vida. Essas consequências podem apresentar-se de formas diferentes para cada pessoa, sendo influenciadas pelo contexto social, econômico, genético e por variáveis ambientais. Além disso, quando se torna crônica, a dor compromete o lazer, o sono, o apetite e as atividades sexual e profissional, resultando em estresse, diminuição da resposta imunológica, o que pode causar depressão e, consequentemente, redução de boa parte da qualidade de vida.
Principais condições associadas
As principais manifestações são: fibromialgia, dor pós-operatória persistente, lombalgia crônica, dor neuropática e cefaleia crônica. Também é comum o aparecimento de dor crônica devido à alguns tipos de câncer.
Dentre as predominâncias da dor crônica, além da fibromialgia, estão: a dor pós-operatória, de 30% a 70%; de emergência (pronto-socorro), cerca de 90%; com câncer, de 55% a 85%; a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida/AIDS, de 30% a 90%; lombalgia em trabalhadores adultos, de 18% a 90%; e, entre os idosos institucionalizados, aproximadamente 80%. Quanto à região corporal mais prevalente da dor crônica, destaca-se como mais significativa a região dorsal ou lombar.
Avaliação da dor crônica: escalas e critérios clínicos
A avaliação da dor é a base para prescrição terapêutica e para avaliação dos resultados obtidos. As avaliações devem ser bem documentadas, sequenciais, sistematizadas e em intervalos regulares. O objetivo da avaliação é qualificar, detalhar como é a dor desse paciente usando perguntas para melhor entender o que ele sente e poder entrar com os cuidados.
- História da dor:Início da dor, período e duração dos episódios, qualidade da dor, intensidade da dor, local da dor, sinais e sintomas associados, fatores de piora e melhora da dor e tratamento prévio.
Escalas
- Escala Verbal Numérica: instrumento unidimensional de avaliação da dor que mensura a intensidade da dor em um intervalo de 0 a 10, no qual zero corresponde à ausência de dor e dez corresponde à pior dor imaginável. Utilizada para pacientes adultos e crianças a partir de 06 anos, com capacidade cognitiva preservada e que demonstram compreensão da escala. Pacientes com déficit de comunicação verbal, porém com cognitivo preservado podem utilizar a mesma escala, escrevendo, sinalizando ou confirmando o score de dor apontado pela equipe.

- Escala Visual Analógica: Escala Visual Analógica compreende uma linha horizontal, com as extremidades definidas como “sem dor” e “máxima dor”. Pede-se para o paciente avaliar quanto dói, nesta escala entre “sem dor” e “máxima dor”; logo, o indivíduo deve saber localizar nessa linha o ponto que corresponde à sua dor. A intensidade da dor é calculada medindo a distância entre o ponto inicial (“sem dor”) e o local que o indivíduo marcou.

- Escala comportamental de dor Behavior Pain Scale (BPS): utilizada em pacientes inconscientes, sob sedação e ventilação mecânica. Avalia expressão facial, movimentos corporais e tolerância a ventilação mecânica. Ausência de dor pontua 1, máximo de dor pontua 4. A pontuação total vai 3 (ausência de dor) a 12 (dor máxima).

Cuidados de enfermagem na abordagem da dor crônica
Uso de analgesia prescrita e administração segura
StartFragmentA Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza os seguintes princípios do tratamento da dor:
- Boca: escolha pela via de administração menos invasiva possível; quando houver possibilidade, opte pela via oral, seguida das vias transdérmica, hipodermóclise, endovenosa e subcutânea, buscando evitar a via intramuscular.
- Relógio: analgésicos prescritos conforme o tempo de ação de cada um, para evitar que a dor apareça. É também necessário um medicamento SOS para ser administrado nos intervalos desses medicamentos, a fim de prevenir o aparecimento da dor.
- Escada: escada analgésica da dor, criada pela OMS para conduzir o tratamento da dor, associando sua intensidade às classes de medicamentos indicadas.
- Pelo indivíduo: levar sempre em conta as respostas do indivíduo e suas características.
- Atenção aos detalhes: reavaliar sempre.EndFragment

Dor Fraca: analgésicos não opióides
- 1 - Analgésicos
Paracetamol: 500mg a 1000mg a cada 4 ou 6 horas, dose máxima de 4g/dia.
Dipirona Sódica: 500mg a 2000mg a cada 6 horas.
- 2 - Anti-inflamatórios não esteroidais (AINES)
Ibuprofeno: 200 mg a 800 mg a cada 6-8 horas; dose máxima 3200 mg/dia.
Diclofenaco: 100 a 150 mg/dia, dividida em 2 a 3 tomadas, dose máxima diária 200 mg/dia.
- 3 - Corticóides
Dexametasona: dose inicial de 2 mg até 2x ao dia VO ou EV. Recomenda-se não ultrapassar a dose de 16 mg/dia.
Dor moderada: analgésicos opióides fracos + não opióides
- Codeína:
- Dose inicial: 30 mg a cada 6 horas.
- Dose máxima: 360 mg/dia.
- Frequência de administração recomendada: a cada 4 horas ou a cada 6 horas.
- Via de administração: oral, sonda nasoenteral ou gastrostomia.
- Tramadol:
- Dose inicial: 50 mg a cada 8 horas.
- Dose máxima: 400 mg/dia.
- Frequência de administração recomendada: a cada 6 horas ou a cada 8 horas.
- Via de administração: oral, endovenosa e hipodermóclise.
Para tratamento da dor moderada, normalmente são prescritos opióides fracos como tramadol e codeína. Pode-se usar o paracetamol 500mg associado à codeína 30mg via oral ou tramadol 25mg de 6/6h. Caso não se obtenha alívio da dor pode-se dobrar a dose da codeína chegando até 60mg de 6/6h ou 4/4h, a dose máxima recomendada é 360mg/dia. Se a analgesia não foi suficiente, a dor é considerada intensa.
Dor forte: analgésicos opióides fortes + não opióides
- Fentanil: é um analgésico narcótico que se caracteriza pelas seguintes propriedades: rápida ação, curta duração e elevada potência (100 vezes maior do que a da morfina). 1 - 4 mcg/kg/h, diluir 20 ml de fentanila em 80 ml de soro fisiológico 0,9% ou soro glicosado. Administrar em bomba infusora, de 25 a 100 microgotas por hora.
- Fentanil transdérmico
- Dose inicial: considerar dose prévia de opioide, a menor posologia disponível é 12,5 mcg/h a cada 72 horas.
- Dose máxima: não tem efeito teto, o que limita o aumento de dose é o efeito colateral.
- Frequência de administração recomendada: o adesivo deve ser trocado a cada 72 horas, ou seja, a cada 3 dias.
- Via de administração: transdérmica (adesivo).
- Morfina:
- Dose inicial: considerar dose prévia de opióide.
- Dose máxima: não tem efeito teto, o que limita o aumento de dose é efeito colateral.
- Frequência de administração recomendada: a cada 4 horas; em pacientes com disfunção renal ou hepática, ou idosos frágeis, considerar a cada 6 horas.
- Via de administração: oral, sonda nasoenteral, gastrostomia, endovenosa, subcutânea, hipodermóclise.
- Metadona:
- Dose inicial: considerar dose prévia de opioide.
- Dose máxima: não tem efeito teto, o que limita o aumento de dose é efeito colateral.
- Frequência de administração recomendada: em geral, a cada 12 horas ou a cada 8 horas. Em caso de doses mais altas, considerar fracionar a cada 6 horas.
- Via de administração: oral, endovenoso, subcutâneo, hipodermóclise.
O enfermeiro deve estar atento aos principais efeitos colaterais dos medicamentos, principalmente dos medicamentos opióides, que normalmente são: sedação, constipação, náuseas e vômitos, prurido, retenção urinária, efeitos cardiovasculares, hiperalgesia e mioclonia.
Outro ponto muito importante é a intoxicação por opióides que pode acontecer com aumento da dose de forma rápida ou dose inicial muito alta, seus sinais são: miose bilateral, sedação e depressão respiratória. Qualquer sinal ou sintoma que o paciente apresente, deve ser comunicado ao profissional médico, que dará a conduta a ser seguida.
Medidas não farmacológicas
A dor crônica envolve respostas humanas complexas, abrangendo as dimensões física, emocional, social e espiritual. Ademais, resulta em isolamento social, alterações na autoimagem e na autoestima, afetando não somente os aspectos fisiológicos da pessoa com dor, mas também sua relação com os outros e com o ambiente em que vive.
Ao avaliar e cuidar de pessoas com dor crônica, os enfermeiros devem identificar as necessidades humanas de forma integral e implementar intervenções baseadas em evidências para alcançar resultados positivos. A utilização do processo de enfermagem com terminologia padronizada pode identificar padrões de cuidados, colaborar para a padronização da linguagem e facilitar a avaliação da qualidade da assistência.
Ademais, estudos comprovam que o cuidado multiprofissional alcança bons resultados nesses pacientes. Portanto, incentivar a parceria com fisioterapeutas, psicólogos, relaxamentos e terapias holísticas pode melhorar a qualidade de vida desses pacientes.