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Eosinofilia: diagnóstico, classificação e manejo

Eosinofilia é definida pela presença de eosinófilos acima de 450 células/mm3, sendo valores acima de 1500 células/mm3 considerados como hipereosinofilia e medidas acima de 5000 células/mm3 consideradas graves. Vale lembrar que eosinófilos são células bem diferenciadas, provenientes da medula óssea e que são parte do sistema imune. Elas fazem parte da resposta de defesa do organismo, em especial contra helmintos e outros parasitas.

Como grupo, eosinofilia é um evento comum, ocorrendo em 5-10% da população em geral. Entretanto, na grande maioria das vezes, a causa é benigna e secundária a outra doença já conhecida. Em países desenvolvidos as principais causas são alergias e atopias, mas no mundo de uma forma geral são doenças helmínticas. Pelo perfil sócio-demográfico brasileiro, apesar da falta de dados, é provável que essas duas principais etiologias tenham prevalência semelhante.

O desafio principal para o médico que se depara com um indivíduo com eosinofilia é diferenciar causas secundárias, comuns e benignas, de uma potencial neoplasia hematológica eosinofilia primária. Além das definições apresentadas acima, algumas outras são importantes e estão apresentadas na
Tabela 1
.

Tabela 1.
Definições sobre eosinofilia. Adatado da referência 2.

Avaliação clínica

Um aspecto relevante da eosinofilia, em especial dos casos de hipereosinofilia e hipereosinofilia grave, é que as manifestações clínicas decorrente da infiltração de eosinófilos nos órgãos independe da etiologia (primária ou secundária). Também deve-se lembrar que pacientes sem síndrome hipereosinofílica serão assintomáticos ou terão apenas manifestações da doença que está causando a elevação dos eosinófilos.

Quanto aos sintomas da eosinofilia, eles podem ser inespecíficos, como fadiga, milagia, angioedema e
rash
. Os sintomas da síndrome hipereosinofílica rash, prurido e placas, bem como sinais de infiltração pulmonar, digestiva e cardíaca (pneumonite, gastroenterite e miocardite). Pode haver fibrose nesses tecidos, por efeito direto dos eosinófilos. Além desses sintomas, podem haver manifestações reumáticas, tromboses, infecções recorrentes. No exame físico, deve-se buscar lesões cutâneas, hipertrofia de cornetos e pólipos nasais, hipotensão postural, linfonodomegalia e esplenomegalia.

A avaliação complementar busca identificar dano tecidual. Recomenda-se realizar exames complementares em pacientes com eosinófilos acima de 1500 células/mm3 de forma persistente. Hemograma com esfregaço do sangue periférico e contagem de plaquetas, função hepática e renal, dosagem de LDH, vitamina B12, proteína C reativa e troponina. Ecocardiograma, exames de função pulmonar e radiografia (ou tomografia) de tórax também costumam ser realizados. Se disponível, tripatse, além da vitamina B12, auxiliam na diferenciação de causas primárias e secundárias.

Por fim, em casos que não se identifica a etiologia ou que existem sintomas suspeitos, testes cutâneos de reação a fármacos, ANCA, sorologias (HIV, HCV, HBV, CMV e parvovírus), tomografias de tórax e abdômen e imunofenotipagem de sangue periférico podem auxiliar na identificação da causa.

Pesquisa de parasitas ou tratamento empírico, dependendo do contexto, devem ser considerado. Pacientes com mais de 5000 eosinófilos/mm3, elevação de vitamina B12 ou triptase, esfregaço do sangue periférico sugerindo blastos ou outras anomalias da maturação dos leucócitos ou aumento de linfonodos, baço ou fígado, devem ser submetidos a aspirado e biópsia de medula óssea para afastar diagnóstico de neoplasias hematológicas.

Causas: primárias e secundárias

O diagnóstico e diagnóstico diferencial da eosinofilia envolve identificar se trata-se de um caso de eosinofilia primária ou secundária. Ou seja, deve-se buscar identificar se o paciente em questão tem uma mutação que leva a um aumento desordenado dos eosinófilos (ou seja, uma neoplasia hematológica) ou uma alteração que leva a um aumento secundário dos eosinófilos. Conforme apresentado na
Tabela 1
, uma terceira categoria (eosinofilia idiopática) compreende pacientes com elevação persistente e não grave dos eosinófilos, sem manifestações clínicas ou laboratoriais em órgãos-alvo e que tampouco se identifica a etiologia. Para estes pacientes, observação clínica, com hemogramas periódicos parece ser suficiente.

Quanto às eosinofilias primárias, assim como vem ocorrendo nas últimas 2-3 décadas, está se identificando o perfil de mutações que causa a expansão clonal e, assim, estão surgindo tratamentos direcionados.
PDGFRA
,
PDGFRB
,
FGFR1
são alguns desses genes. Independente do gene potencialmente acometido, são sinais de uma possível eosinofilia primária:

  • sintomas constitucionais;
  • leucograma com blastos, leucoeritroplastose, neutrofilia, monocitose, basofilia, trombocitopenia;
  • anemia;
  • vitamina B12 e triptase elevada.

Para identificação de causas secundárias, como esperado, o exame clínico é o principal recurso. A lista de causas é bastante ampla, mas deve-se investigar ativamente história de atopia, asma e infecções recorrentes, alergias alimentares, medicamentos em uso ou utilizados recentemente, história familiar de hipereosinofilia. Alguns diagnósticos incomuns, mas que o médico deve estar atento, são granulopatose eosinofílica com poliangeíte, síndrome de Behçet e de Sjögren, artrite reumatóide, aspergilose pulmonar, além de neoplasias sólidas ocultas.

Abordagem diagnóstica

Conforme já discutido, o principal objetivo da avaliação de um paciente com eosinofilia é diagnosticar possíveis causas secundárias, estar atento à sinais que sugiram acomentimento por neoplasia hematológica e identificar eventuais danos em órgãos-alvo.

A
Figura 1
resume a abordagem, destacando-se que o primeiro passo é confirmar a alteração laboratorial em um segundo exame de hemograma. Um ponto relevante aqui é sempre utilizar a contagem
absoluta
de eosinófilos, uma vez que a relativa é influenciada pelo número total de leucócitos (principalmente neutrófilos) e pode levar a interpretações errôneas.

Figura 1.
Investigação de pacientes com eosinofilia. Adaptado de 1 e 2.

Tratamento

Como discutido, um grupo significativo de pacientes (assintomáticos e sem hipereosinofilia grave) podem ser acompanhados periodicamente sem tratamento específico. Naqueles em que se identifica causa secundária ou acometimento específico (esofagite eosinofílica), o tratamento deve ser direcionado para estas condições. Nos pacientes com eosinofilias primárias monoclonais com mutações específicas, o manejo deve ser com terapia dirigida (por exemplo, imatimibe para mutação no
PDGFR
).

Para os demais pacientes com síndrome hipereosinofílica, busca-se reduzir o número de eosinófilos nos órgãos e minimizar o dano tecidual. Nestes pacientes corticosteróides são o principal tratamento. Em casos de grave acometimento sistêmico pela síndrome hipereosinofílica, em especial cardio-pulmonar, doses elevadas de corticóide devem ser iniciadas imediatamente, mesmo que se suspeite de causa primária ou secundária específica.

Para os demais pacientes utiliza-se prednisona na dose de 1 mg/kg/dia por 1-2 semanas com redução gradual ao longo de 2-3 meses para evitar recorrência. Deve-se lembrar de realizar profilaxia de strongilodíase disseminada, usualmente com ivermectina em dose única, 200 mcg/kg/dia por 2 dias nos pacientes que se inicia glicocorticóides.

Se houver recorrência dos sintomas com doses de prednisona maiores que 10 mg/dia, interferon e hidroxiureia são opções. Na falha desses, mepolizumab e alemtuzumab são os anticorpos monoclonais considerados - a depender da disponibilidade.

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