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Insolação: prevenção dos efeitos do calor em crianças

Depois do ano mais quente já registrado, com algumas ondas de calor de grande intensidade no nosso país, é interessante lembrar do tema da insolação.

A insolação pode ser uma emergência médica que surge quando o organismo de uma criança atinge níveis elevados de superaquecimento, comprometendo sua capacidade eficaz de resfriamento. Esse quadro pode manifestar-se desde sintomas leves até desdobramentos graves na saúde, incluindo possíveis danos aos órgãos.

Este artigo visa abordar as origens, os sintomas, as abordagens de tratamento e as medidas preventivas associadas à insolação.

Definição e fisiopatologia

A insolação ocorre quando a termorregulação do corpo falha devido à exposição excessiva ao calor — e não ao sol exclusivamente! O nome em inglês para o quadro é
heat stroke
, um ataque de calor. A insolação não está restrita apenas à exposição prolongada ao sol; o calor excessivo em ambientes fechados também pode desencadear essa condição, podendo, em casos extremos, ser fatal. Infelizmente, temos testemunhado casos recentes na mídia em que crianças foram vítimas dessa situação quando deixadas em veículos automotores.

As crianças são mais vulneráveis que os adultos, pois o mecanismo de termorregulação é menos eficiente. Isso ocorre pelas seguintes características:

  • metabolismo basal maior, com maior produção de calor;
  • maior superfície corporal por peso, aumentando área de absorção de calor;
  • menor volume absoluto de sangue e menor débito cardíaco;
  • menor produção de suor e início do suor em temperaturas maiores;
  • tendencia a tomar menos líquidos se não supervisionadas durante exercício/brincadeira;
  • aclimatação mais lenta do que os adultos — demoram 10 a 14 dias para atingir adaptações a climas quentes;
  • costumam realizar atividades com maior intesidade física, como corrida, jogos, esportes, mesmo em ambientes quentes.

Esse superaquecimento pode resultar em danos aos sistemas nervoso, circulatório e muscular, além de afetar os órgãos internos.

Identificação de sinais e sintomas de insolação

Nos artigos em inglês, vemos uma divisão entre quadros leves e graves. Os mais leves são chamados de
heat exhaustion
, e os mais graves de
heat stroke
. O que parece marcar a diferença é a temperatura corporal e a capacidade de suar. Confira os sintomas associados a cada quadro:

Sintomas iniciais

  • dores de cabeça;
  • tontura;
  • náuseas e vômitos;
  • pele quente e seca;
  • pulso rápido;
  • temperatura elevada;
  • distúrbios visuais;
  • confusão mental.

Sintomas associados a quadros graves

  • respiração rápida e difícil;
  • palidez, síncope;
  • convulsão;
  • temperatura do corpo muito elevada;
  • cianose de extremidades;
  • perda de força muscular;
  • rebaixamento do nível de consciência.

Apesar da diferença nos sintomas, os quadros leves devem ser tratados imediatamente.

Tratamento da insolação em crianças

Pré-hospitalar

O tratamento imediato consiste em diminuir a temperatura corporal do paciente. No atendimento pré-hospitalar, podem ser realizadas as seguintes medidas:

  • parar eventual atividade física ou brincadeira;
  • levar a criança para um ambiente fresco e arejado ou para ambiente resfriado por ar condicionado;
  • remover excesso de roupas e aplicar compressas frias;
  • oferecer água fresca ou soros de hidratação oral frios, se a criança estiver consciente.

Se o paciente apresentar sinais de gravidade ou não apresentar melhora em 30 minutos com as medidas acima, o mesmo deve ser tratado em hospital.

Hospitalar

No hospital, é importante a medida de temperatura central (retal, esofágica, oral), além de monitorização dos outros sinais vitais.

Pode ser feita infusão de soro fisiológico (NaCl 0,9%), endovenosa, 20ml/kg (máx 1L na infusão inicial) e coleta de exames, incluindo eletrólitos com gasometria venosa associada, corrigindo qualquer distúrbio de sódio presente.

Se houver qualquer alteração neurológica grave ou leve, mas mantida por mais de 30 minutos após o tratamento, deve-se tratar como insolação grave ou heat stroke, o que inclui:

  • manter via aérea pérvia (pode necessitar via aérea avançada por alteração neurológica);
  • respiração: oferecer oxigênio suplementar conforme a necessidade;
  • circulação: conseguir dois acessos calibrosos (considerar acesso intraósseo rapidamente se não houver sucesso nas primeiras tentativas de acesso venoso periférico), para uma dose inicial de 20 a 40 ml/kg de solução isotônica (soro fisiológico, ringer lactato), em temperatura ambiente. Se mantiver sinais de choque, tratar como choque, segundo o PALS;
  • disability: o nível de consciência e sinais neurológicos melhoram com as medidas anteriores. Se houver convulsão tratar com benzodiazepínicos (como midazolan 0,2mg/kg);
  • resfriamento rápido: a medida hospitalar mais indicada é borrifar água morna (para evitar calafrios e outras medidas de produção de calor) enquanto o paciente está sob ventilador de alta potencia/fluxo de ar, otimizando o resfriamento evaporativo (o mais efetivo para o corpo humano). Outras medidas como cobertor de resfriamento, pacotes de gelo em pescoço, axilas e virilha, além da solução cristalóide à temperatura ambiente, contribuem para o resfriamento. A temperatura alvo é de 38°C em medida central (retal ou esofágica). Quando não é possível fazer o método evaporativo (água + ventildor), imersão em água fria é um método indicado, mas os calafrios e agitação são um fator limitante;
  • calafrios: o controle dos calafrios é importante e pode ser necessário utilizar benzodiazepínicos e até intubação com bloqueio neuromuscular para tratá-los.
  • após a estabilização e resfriamento rápido inicial, deve-se tratar as lesões de órgão alvo como rabdomiolise, alterações hidreletrolíticas, coagulação intravascular disseminada (CIVD), injúria renal aguda (IRA), desidratação hiponatremica, choque cardiogênico com vasodilatação periférica, edema pulmonar agudo, insuficiência hepática e edema cerebral, entre outros.

Tratamento ineficazes

O uso de antipiréticos não apenas se mostra ineficaz, mas também é contraindicado. Além disso, banhos com álcool, apesar de serem uma abordagem comum, podem resultar na absorção cutânea, levando a possíveis casos de intoxicação. Importante ressaltar que o Dantrolene, embora seja empregado no tratamento da hipertermia maligna, carece de evidências que comprovem seus efeitos positivos em pacientes pediátricos.

Prevenção da insolação em crianças

A insolação é um quadro completamente prevenível, então deve-se focar muito na prevenção. Confira algumas medidas:

  • limitar a exposição ao sol, especialmente durante as horas mais quentes;
  • incentivar a ingestão regular de líquidos;
  • vestir roupas leves e claras e aplicar protetor solar;
  • não deixar crianças em veículos sem acompanhamento de um adulto;
  • atentar para locais muito quentes, mesmo sem exposição direta ao sol;
  • evitar atividades físicas em dias e locais muito quentes, especialmente nas horas mais quentes do dia e em locais com exposição solar direta;
  • considerar aclimatação adequada para prática de atividade física intensa.

Conclusão

Estamos inseridos em um mundo que está gradativamente se tornando mais quente, e lamentavelmente, esse cenário pode se tornar cada vez mais comum. A insolação é uma condição potencialmente grave, mas, com prevenção e tratamento adequados, seus riscos podem ser significativamente reduzidos. A educação de pais, cuidadores e profissionais de saúde sobre os sinais, sintomas e estratégias de prevenção é vital para proteger a saúde das crianças.