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Sensores, wearables e smartwatches: quais as evidências de utilidade para a saúde?

O uso de sensores para medida de parâmetros biológicos diretamente pelo usuário final não é novo. Glicosímetros, esfigmomanometros automáticos, termômetros e oxímetros de pulso são usados há décadas. Apesar disso, foi nos últimos anos que se viu expansão e popularização desses recursos e crescente interesse em pesquisa de novas tecnologias.  

Especula-se que será possível integrar as medidas de diversos sensores para manutenção da saúde e diagnóstico precoce de forma individualizada. Esses dados poderão ser automaticamente enviados para o médico e o prontuário eletrônico do indivíduo. Os equipamentos que realizam essas aferições são chamados coletivamente de
wearables
(do inglês vestir), pois costumam ser acoplados a peças de vestuário, como relógios inteligentes (
smartwathces
), óculos, peças de roupa, pulseiras. 

É importante destacar que não trata-se de um assunto de "nicho" (de interesse exclusivo de pacientes com hipertensão arterial, por exemplo), mas um mercado em expansão e que tem uma interface grande entre cuidados em saúde e consumo. Estima-se que em 2020 foram gastos mais de US$ 2,8 bilhões em equipamentos deste tipo. Destes, os mais utilizados são os que fazem monitorização de atividade física; eles vão desde simples contadores de número de passos (pedômetros) até equipamentos que avaliam distância percorrida, gasto energético, frequência cardíaca e desempenho esportivo através de múltiplos parâmetros. Apesar disso, apenas uma pequena fração desses produtos foi formalmente testada em estudos clínicos experimentais.  

Considerando a popularidade crescente, os desejados efeitos benéficos desses equipamentos, mas também os custos e potenciais riscos, é importante que o clínico saiba os efeitos comprovados desses
wearbles
(e, portanto, o que ainda é especulação). Para isso, vamos explorar as evidências de benefício desses equipamentos, dando especial atenção aos efeitos dos monitores de atividade física.   

Monitores de atividade física
 

Inatividade física é causa de mortalidade e aumento do risco de doenças crônicas como diabetes
mellitus
(DM)
tipo 2, hipertensão e doença mental. Apesar de ter pouco efeito para redução de peso, exercícios moderados a vigoroso tem bons resultados para manutenção do peso. Intervenções capazes de aumentar a realização de atividades físicas, tanto do ponto de vista individual, quanto populacional, são de grande interesse. Assim, monitores de atividade física (usualmente na apresentação de
smartwathces
ou pedômetros) tem o potencial de estimular a realização de atividade física em um contexto de automonitoramento. E, além de estimular a realização de atividade física, há a expectativa de que eles promovam a melhora de outros parâmetros como peso e pressão arterial.  

Estudos clínicos sobre esses
wearables
mostram que os efeitos desses equipamentos ocorrem em diversos níveis. Do ponto de vista de estimular a realização de atividade física, eles promovem a realização adicional de 1800 passos, 40 minutos de caminhada e 6 minutos de atividades moderadas a vigorosas ao dia. Em termos de perda ponderal, esses monitores promovem pequena redução de peso e de circunferência abdominal. Outros efeitos incluem aumento da capacidade funcional, redução da pressão arterial sistólica e do colesterol LDL; há tendência de redução de dor, porém sem significância estatística. 

É importante destacar que esses efeitos se mantêm independentemente da faixa etária avaliada (crianças, adultos e idosos) e tipo de equipamento, tanto para população geral quanto para pessoas com morbidades. Uma limitação da grande maioria dos estudos é a curta duração (3 a 6 meses). Avaliações mais longas indicam uma redução da eficácia - apesar de os benefícios de aumento de atividade física se manterem por até 4 anos. Havia preocupação com surgimento ou piora de sintomas de ansiedade ou redução da qualidade de vida em função de monitorização frequente, mas isso não foi identificado.  

Por outro lado, alguns benefícios esperados não se confirmam nos estudos empíricos: não há redução da glicemia, dos triglicerídeos ou da limitação física. Entretanto, para esse desfechos, o número de estudos é menor.   

Sensores para COVID-19
 

A pandemia de COVID-19 exigiu que muitos pacientes fossem manejados sem contato médico direto, seja no momento da avaliação inicial, seja no seguimento. Além disso, o grande número de infectados exauriu a capacidade de atendimento no sistema de saúde tradicional. Assim, sensores capazes de realizar diagnóstico de COVID-19 ou monitoramento de deterioração clínica ganharam grande interesse. 

Por avaliarem a presença e o grau de hipoxemia, oxímetros de pulso foram os principais equipamentos utilizados para monitorar a piora clínica. Cuidados com medida adequada (sem esmalte de unhas, dedos aquecidos, medir por 60 segundos) são importantes para evitar falsos positivos.   

Apesar do racional consistente, um único ensaio clínico avaliou a eficácia adicional de oxímetros além do monitoramento de sintomas (especialmente dispneia). Esse estudo não mostrou diferença em nenhum dos desfechos (hospitalização, sobrevida, ansiedade). A maioria dos paciente foi diagnosticada com casos leves e em consultas ambulatoriais, portanto esses resultados talvez não se apliquem para uma população de maior gravidade. Assim, recomenda-se a utilização desse recurso apenas por pacientes que já tenham o equipamento em casa, que sejam capazes de compreender sua utilização e em associação com monitoramento de sintomas.  

Além dos oxímetros de pulso, uma série de outros parâmetros podem ser avaliados no domicílio: temperatura, frequência cardíaca e respiratória, padrão da tosse, eletrocardiograma e pressão arterial. Infelizmente, a maioria desses recursos não foi adequadamente testada e, como grupo, deve ser considerada preliminar . O principal recurso para o diagnóstico precoce de COVID-19, em fase pré-sintomática, parece ser aumento da temperatura da pele e da frequência cardíaca; infelizmente nenhum desses recursos pode ser considerado suficientemente testado para uso clínico.  

Outros usos
 

Detecção de arritmia
 

A grande maioria dos
smartwatches
do mercado é capaz de monitorar a frequência cardíaca e inferir a presença de fibrilação atrial ou outras taquicardia supraventriculares através de mudanças súbitas da frequência cardíaca e acompanhada de sintomas.  

Outros equipamentos são capazes de um eletrocardiograma (com uma derivação), seja através de um equipamento específico ou acoplado no relógio. A expectativa é que esses equipamentos permitam a monitorização e diagnóstico de arritmias, em especial fibrilação atrial.  

Em uma grande avaliação populacional, houve a detecção de novos casos de fibrilação atrial, mas às custas de um grande número de falsos positivos. Além disso, ainda são necessários estudos para definir se tratar arritmias identificadas por esses sensores confere benefício clinicamente significativo aos pacientes.  

Glicose
 

A monitorização de glicemia é parte fundamental do tratamento da totalidade dos pacientes com DM tipo 1 e uma significativa fração daqueles com DM tipo 2. Em função disso e do desconforto relacionado à coleta de sangue capilar (diversas "picadas" ao dia), há grande interesse em monitorar a glicemia de outras formas.  

Recursos incluem desde a detecção de hipoglicemia através da frequência cardíaca e monitorização eletrocardiográfica até a dosagem de glicose através de bioimpedância, saliva, suor e lágrimas . Infelizmente, nenhum desses recursos está em uso clínico no momento.  

Resumo
  

  • Monitorização de parâmetros biológicos diretamente pelos indivíduos tem ganhado mais interesse nos últimos anos, mas uma grande parte desses equipamentos não foi adequadamente testada.  
  • Eles são apresentados em formado de acessórios, principalmente relógios (
    smartwatches
    ). Outras apresentações são óculos, peças de vestuário e pulseiras. 
  • Os monitores de atividade física são os equipamentos mais testados, com resultados consistentes para aumento da quantidade de exercício realizada. Outros efeitos são redução de peso e da pressão arterial, bem como aumento da capacidade funcional. 
  • Apesar de oxímetros de pulso serem utilizados no monitoramento de deterioração de pacientes com COVID-19, a eficácia disso não foi comprovada em pacientes com quadros leves. Equipamentos para diagnóstico precoce ainda estão sendo desenvolvidos e testados.  
  • Novas formas de monitorar o ritmo cardíaco (para diagnóstico de arritmias) e a glicemia (para manejo do DM) estão sendo estudadas e é provável que comecem a ser utilizadas clinicamente nos próximos anos.