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Autismo e ansiedade: entenda a relação e as estratégias de tratamento

O autismo e a ansiedade frequentemente estão relacionados, sendo que a prevalência de transtornos de ansiedade é significativamente alta em indivíduos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A ansiedade é considerada uma das comorbidades psiquiátricas mais recorrentes nesses indivíduos. De acordo com a
National Autistic Society
(2021), pessoas com TEA apresentam níveis elevados de ansiedade em comparação com a população neurotípica, afetando diretamente seu bem-estar e funcionamento diário.

Rudy (2020) também destaca que dificuldades na compreensão de situações sociais, rigidez comportamental e alterações sensoriais contribuem para o surgimento e manutenção da ansiedade em pessoas autistas. 

De acordo com o DSM-5 (
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
), a ansiedade é caracterizada por sintomas como medo ou preocupação excessiva e persistente, acompanhados de dificuldade em controlar esses sentimentos, o que gera sofrimento significativo. Entre os sintomas físicos mais comuns, destacam-se inquietação, fadiga, dificuldade de concentração, irritabilidade, tensão muscular e alterações no sono.

Já o TEA é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por desafios contínuos na comunicação social e pela presença de padrões de comportamento repetitivos ou restritos (American Psychiatric Association [APA], 2023). 

O diagnóstico da ansiedade em pessoas com TEA é um processo complexo, pois os sintomas frequentemente se sobrepõem a características típicas do autismo. De acordo com a APA (2023), entre essas características, destacam-se: ausência de interação social, comportamentos repetitivos, evitativos, ritualísticos, inflexibilidade cognitiva, dificuldades na comunicação, apatia e falta de reciprocidade social. Esses sinais podem estar presentes tanto no TEA quanto nos transtornos de ansiedade, tornando essencial um diagnóstico diferencial preciso (Torina et al., 2025). 

As origens da ansiedade em indivíduos com TEA são multifatoriais, diversas e frequentemente associadas à dificuldade no processamento de estímulos sensoriais, ao enfrentamento de situações sociais desafiadoras, à resistência a mudanças inesperadas, ao medo do desconhecido e às dificuldades em identificar e expressar emoções.

Pode-se exemplificar alguns fatores específicos relacionados a ansiedade em pessoas com TEA como: a hipersensibilidade sensorial, sendo que muitos autistas têm uma resposta aumentada para estímulos sensoriais, como luz, texturas e cheiros, a depender dos estímulos podem causar uma sobrecarga e desencadear crises de ansiedade. Dificuldades na comunicação e expressão emocional geram frustração e aumenta a ansiedade. A inflexibilidade e resistência a mudanças também influenciam, pois a necessidade de rotina faz com que mudanças sem previsibilidade causem desconforto e medo (Dixon et al., 2023).  

Os desafios nas interações sociais, como dificuldades em compreender normas e interpretar expressões faciais, podem tornar as interações estressantes e resultar à ansiedade social. O processamento cognitivo diferente, com a rigidez de pensamento e preocupação excessiva intensifica o estresse diante situações imprevistas. Experiências traumáticas ou negativas, como bullying e exclusão social, impactam a saúde mental e podem contribuir para transtornos ansiosos. Diante disso, é fundamental que pais, cuidadores e profissionais de saúde e educação estejam atentos aos sinais de ansiedade e ofereçam  a assistência e encaminhem  para o tratamento adequado. 

Quanto às intervenções, a literatura aponta a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), aliada à Teoria das Molduras Relacionais (RFT), uma vez que se tratam de abordagens que atuam na promoção da qualidade de vida e na adaptação socioemocional, o que pode ser benéfico para pessoas com TEA. A ACT e a RFT são abordagens terapêuticas que se complementam no campo da Ciência Comportamental, possibilitando não somente o alívio de sintomas relacionados a ansiedade, mas também promovem uma maior flexibilidade psicológica e cognitiva. Esses aspectos favorecem para que pessoas com TEA consigam lidar melhor com os desafios do seu mundo social e emocional. 

A ACT, enquanto abordagem do campo da Análise do Comportamento Aplicada, destaca-se por sua capacidade de compreender e incorporar a linguagem na sua complexidade, relacionando-a ao comportamento humano.  Apresenta-se como ferramenta eficaz para redução de situações de estresse, provocadas por condições de ansiedade, em diversos ambientes e situações da vida cotidiana. Para além da sua aplicabilidade com pessoas com TEA, Dixon et al. (2023) evidenciam que essa abordagem é eficaz no tratamento de níveis elevados de ansiedade, humor deprimido e pensamentos ou ações suicidas. 

Diante de contextos aversivos que desencadeiam pensamentos disfuncionais e emoções desafiadoras, a ACT dispõe de uma diversidade de estratégias dentro das competências do indivíduo praticante, com o objetivo de modificar o controle verbal em função de eventos privados, facilitando a emissão de respostas adaptativas alinhadas a valores pessoais, e contribuindo, dessa forma, não apenas para a redução do controle aversivo, mas também para o aumento das oportunidades de acesso a reforços positivos. Dixon et al. (2023) enfatizam que a possibilidade de análise e intervenção em processos psicológicos, e não apenas de comportamentos diretamente observáveis, representa um avanço significativo na forma como os profissionais podem abordar uma ampla gama de problemas humanos.  

A terapia baseada na ACT fundamenta-se na transformação das funções por meio de redes relacionais, em que a linguagem tem um importante papel, integrando falante e ouvinte por meio de contingências interrelacionadas, o que permite, segundo Ming (2023), maior versatilidade e abrangência na aplicabilidade da ACT e reforça sua própria base empírica, destacando-se pela eficácia em promover mudanças comportamentais significativas. 

A ACT é implementada de forma individualizada e contextual, com ênfase na aceitação e compromisso com ações alinhadas a valores, e propõe seis processos centrais de flexibilidade psicológica, sendo eles: Momento Presente, Aceitação, Desfusão, Eu como contexto, Valores e Ação Comprometida. Esses processos desdobram-se em componentes comportamentais mensuráveis, que ao serem trabalhados, permitem aos indivíduos enfrentar desafios psicológicos e ambientais de maneira eficaz (Ming et al., 2023).   

De acordo com Dixon et al. (2023), centenas de meta-análises e ensaios controlados randomizados respaldam a abordagem da ACT, apresentando resultados eficazes frequentes e mantidos após a retirada da intervenção. Dessa forma, a intervenção com base na ACT resulta em mudanças comportamentais sustentáveis, mesmo após sua conclusão, demonstrando a durabilidade de seus efeitos na promoção da plasticidade comportamental.  

Além dessas intervenções terapêuticas, técnicas de relaxamento, como respiração diafragmática, mindfulness e organização visual da rotina, têm se mostrado eficazes no apoio emocional de pessoas com TEA. Essas estratégias ajudam na autorregulação, reduzem a sobrecarga sensorial e podem ser facilmente aplicadas no cotidiano, desde que haja orientação adequada (Cai et al., 2023; Gauss, 2019). 

É importante destacar que o tratamento ideal é multidisciplinar, envolvendo psicólogos, psiquiatras, terapeutas ocupacionais, educadores e, sobretudo, a família. A participação ativa dos cuidadores é essencial para identificar os gatilhos da ansiedade e implementar estratégias de suporte no ambiente familiar e escolar (Francisco et al., 2024). 

Compreender a relação entre autismo e ansiedade é um passo essencial para oferecer um cuidado mais empático, eficaz e humanizado. A prática clínica tem mostrado que, quando o sofrimento emocional do autista é reconhecido e tratado com sensibilidade e conhecimento técnico, é possível promover avanços significativos na qualidade de vida, na autonomia e nas relações sociais dessas pessoas. Mais do que tratar sintomas, trata-se de possibilitar caminhos para que cada indivíduo com TEA possa viver com mais bem-estar, segurança e sentido. 

Como citar este artigo: Reis, D. A., Castro, C. C. O., Reis, L. P. A., Lobo, B. O. M., & Neufeld, C. B. (Mar., 2025).
Autismo e ansiedade: entenda a relação e as estratégias de tratamento.
Blog da Artmed. 

Autoras

  • Daniela Aparecida dos Reis
     

Psicóloga e Mestra em Ciências do Desenvolvimento Humano pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Docência no Ensino Superior. Coordenadora do Núcleo de Apoio Psicopedagógico e Inclusão – NAPI. Presidente da Associação TEAcolher Associação de Pais e Voluntários de pessoas autistas de Patrocínio e Região.  

  • Cássia Cassimiro de Oliveira Castro
     

Psicóloga, Especialista em Intervenção ABA para Autismo, Deficiência Intelectual, Certificada IBAO.  

  • Luciana Paiva Arantes Reis
     

Psicopedagoga, Especialista em Intervenção ABA para Autismo, Deficiência Intelectual, Especialista em Intervenção Precoce no Autismo. Certificada QASP-S,  

  • Beatriz de Oliveira Meneguelo Lobo
     

Psicóloga e Mestra em Psicologia (área de concentração Cognição Humana) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutoranda em Psicologia em Saúde e Desenvolvimento pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP), com bolsa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Especialista em Terapias Cognitivo-Comportamentais e com Formação em Terapia do Esquema. Pesquisadora e Supervisora no Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental (LaPICC) da Universidade de São Paulo (USP). Membro associada à Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). 

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    Editora-chefe:
     Carmem Beatriz Neufeld. 

Psicóloga. Livre docente em TCC pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP. Pós-Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora e Mestra em Psicologia pela PUCRS. Fundadora e Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental – LaPICC-USP. Professora Associada do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. Presidente da Federação Latino Americana de Psicoterapias Cognitivas e Comportamentais - ALAPCCO (2019-2022). Presidente-fundadora da Associação de Ensino e Supervisão Baseados em Evidências - AESBE (2020-2023). Bolsista Produtividade do CNPq.