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Doença renal do diabetes: avaliação, diagnóstico e rastreamento

Doença renal do diabetes (DRD) é o nome dado para a complicação microvascular que o diabetes
mellitus
(DM) causa nos rins. Como veremos, muito se avançou no conhecimento desta doença e de sua progressão. Antes considerada uma doença unidirecional e centrada no glomérulo, hoje sabe-se que até 40% das pessoas com perda de função renal pela DRD não tem excreção aumentada de albumina (marcador de dano glomerular).   

O termo mais tradicionalmente utilizado (
nefropatia diabética
) já não é mais recomendado. O nome DRD foi introduzido em 2007 para reforçar o fato que existem diferentes fenótipos da doença (com e sem proteinúria). Alguns textos recomendam até utilizar a expressão
doença renal crônica no diabetes
, uma vez que a relação entre rim e DM é complexa e frequentemente não é possível estabelecer o mecanismo de doença envolvido. No presente texto, daremos preferência ao termo DRD (que é atualmente mais utilizado).   

A DRD é uma das complicações crônicas mais comuns da doença. Atinge até 40% dos indivíduos com diabetes. Para além da magnitude do DM e, portanto, elevada prevalência de suas complicações, especificamente a DRD é a principal causa de insuficiência renal no Brasil e no mundo. Por exemplo, mais de 30% das pessoas que realizam hemodiálise no Brasil têm DM. Além disso, a presença de albuminúria indica maior risco de eventos cardiovasculares (de forma independente de outros fatores).  

Classicamente diz-se que a doença se manifesta em 5 fases, que se inicia pela hiperfiltração, quando ocorre aumento da taxa de filtração glomerular (TFG) e da pressão capilar renal. Após há a fase silenciosa, em que há alterações estruturais, mas TFG e proteinúria estão normais. A esta se seguem as fases clínicas de microalbuminúria (fase 3), macroalbuminúria (fase 4) e insuficiência renal terminal (fase 5). Apesar desta divisão ser útil para entender a fisiopatologia da doença, há grande variabilidade na forma de apresentação, ela não ocorre de forma unidirecional e existem outras formas de dano do DM no rim, incluindo lesões túbulo-intersticiais que cursam sem proteinúria. Além disso, alguns pacientes "regridem" no dano renal, com desaparecimento da albuminúria. Em suma, assim esta divisão em fases não deve ser usada para estadiamento e classificação da doença.   

Apesar deste elevado impacto, pode-se dizer que há um cenário favorável em relação a DRD. Trata-se de uma complicação rastreável, com um método simples, barato e amplamente disponível. Além disso, para aqueles que desenvolvem a complicação, existem intervenções (farmacológicas e de estilo de vida) que podem postergar e até evitar a progressão do quadro.   

Avaliação e diagnóstico
 

A base para a avaliação da DRD é a dosagem de creatinina sérica e de excreção urinária de albumina (albuminúria) em amostra. Alguns aspectos destes exames complementares são relevantes para otimizar o processo de diagnóstico. Quanto à creatinina, é recomendado usar uma técnica laboratorial validada, que seja rastreável em relação aos padrões internacionais. Além disso, o valor da creatinina não deve ser usado isoladamente; o correto é estimar a TFG com alguma fórmula validada em grandes coortes. O cálculo mais aceito atualmente é o
Chronic Kidney Disease Epidemiology Collaboration
(mais conhecido como CKD-EPI) que está disponível em calculadoras online (
www.sbn.org.br
).  

Já na avaliação de albuminúria deve-se dar preferência à avaliação em amostra isolada de urina, sendo esta mais confortável para pacientes e de menor custo. Tanto a concentração isolada de albuminúria (mg/dL), quanto a relação com a creatininúria (mg/g) são igualmente acuradas para detecção de DRD. Além disso, todo teste alterado deve ser confirmado em 2 de 3 amostras coletadas com intervalo de 3-6 meses.   

O diagnóstico de DRD pode ser dado de forma presuntiva na maioria das pessoas com pelo menos 5 anos de doença, com dano renal (albuminúria aumentada ou TFG reduzida) e sem características que gerem suspeita para outra causa de dano renal. Assim, a maioria dos pacientes não necessitarão de investigação adicional (biópsia renal). Por outro lado, o diagnóstico de que o dano renal é atribuível ao DM não deve ser "automático"; na presença de alguma característica atípica deve-se atentar para causas alternativas para perda de função renal e considerar a realização de biópsia renal. São indicadores de possível causa alternativa: 

  • Proteinúria marcadamente elevada no início do quadro ou de progressão acelerada (em poucos meses); 
  • Proteinúria em nível nefrótico (>3,5g ao dia); 
  • Proteinúria em pessoa com DM tipo 1 iniciando antes de 5 anos do diagnóstico; 
  • Pessoa com DM tipo 1 com dano renal, mas sem retinopatia; 
  • Queda de TFG maior que 4 ml/min a cada ano; 
  • Exame comum de urina com sedimento ativo (hematúria, dismorfismo eritrocitário ou cilindros celulares); 
  • Sinais clínicos ou laboratoriais de outra doença sistêmica (por exemplo, anemia hemolítica, hepatite viral).  

Estadiamento
 

De forma conjunta ao diagnóstico, deve-se estadiar o risco do paciente desenvolver complicações (principalmente progredir para doença renal terminal e eventos cardiovasculares. A
Figura 1
apresenta o estadiamento proposto pela associação americana de nefrologia e endossado pela sociedade brasileira de diabetes.   

Este esquema de estadiamento, que combina TFG estimada e albuminúria, é considerado um avanço em relação à classificação anterior de normo, micro e macroalbuminúria. Ele prevê que o comprometimento da TFG e a presença de albuminúria são fatores de risco associados, mas independentes para a ocorrência de complicações. Assim, este esquema de classificação contempla outras formas de apresentação e evolução da DRD que não apenas o dano glomerular com proteinúria.   

Figura 1.
Sistema de estadiamento da gravidade da doença renal do diabetes. Extraído da referência 1.

Um aspecto adicional que os médicos atendendo pacientes com DM devem estar atentos é que a relação entre albumina urinária e doença renal e cardiovascular é linear e progressiva. Ou seja, valores de albuminúria detectáveis, mas menores que  < 30 mg/dL, mesmo que "normais", indicam risco aumentado. E este risco aumenta quanto maior o valor do exame. Adicionalmente, a regressão da albuminúria (redução nos valores do exame) é marcador de bom prognóstico na DRD.  

Rastreamento
 

Por se tratar de uma condição de alta prevalência em pacientes com DM e que cursa sem manifestações clínicas nos seus estágios iniciais e mesmo avançados, o rastreamento de DRD tem um forte racional para realização. Ele é medida eficaz para identificar pacientes em risco de progressão para estágios mais avançados da doença e permitir realização de tratamento nefroprotetor.   

Recomenda-se realizar este rastreamento com creatinina sérica e dosagem de albumina urinária (com ou sem creatinina urinária) uma vez ao ano. Este rastreamento deve ser iniciado logo ao diagnóstico do DM tipo 2, enquanto no DM tipo 1 ele deve ser iniciado 5 anos após o diagnóstico. 

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