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Esteatose hepática: como realizar avaliação do paciente

Esteatose hepática é a deposição de triglicerídeos nos hepatócitos.
É uma das anormalidades mais comuns identificadas em exames de imagem do fígado. Os hepatócitos no centrolobulares (próximos à veia central) são especialmente sensíveis ao estresse metabólico, e são os primeiros afetados.
 

As
principais causas de esteatose hepática são o consumo de álcool e doença hepática gordurosa não-alcoólica (DHGNA)
. Pode-se atribuir a esteatose ao álcool em pacientes com consumo abusivo, porém antes de termos o diagnóstico de DHGNA, deve-se considerar outras etiologias (
tabela 1)

 
Tabela 1.
Condições associadas com esteatose hepática (1–3). 

  • Etilismo 
  • Doença hepática gordurosa não-alcoólica* 
  • Hepatites virais (HBV, HCV) 
  • Medicamentos (esteroides, quimioterápicos, anticonvulsivantes) 
  • Alterações nutricionais (nutrição parenteral, perda ponderal rápida, má-nutrição) 
  • Iatrogênica (radioterapia) 
  • Desordens metabólicas congênitas (aminoacidopatias, defeitos na oxidação de lipídios) 
  • Doenças de depósito (distúrbios de depósito do glicogênio, deficiência de alfa1-antitripsina, hemocromatose, doença de Wilson) 
  • Fibrose cística 
  • Síndromes dismórficas associadas com obesidade (Prader-Willi)

* O consumo de álcool para caracterizar esteatose hepática não-alcoólica é inferior a 21 doses semanais para homem e 14 doses semanais para mulheres; cada dose equivale a 30mL de bebidas destiladas, 120mL de vinho ou 360mL de cerveja. 

Investigação inicial
 

Anamnese e exames laboratoriais 

A maioria dos pacientes com esteatose hepática é assintomática ou tem sintomas inespecíficos, como fadiga e desconforto abdominal. O diagnóstico em geral é feito por acaso em exames de imagem
.
Deve-se atentar para possíveis pistas para as condições apresentadas na
Tabela 1
. Em especial, a revisão ativa de medicamentos, chás naturais, suplementos alimentares e fitoterápicos é fundamental.   

A
Tabela 2
resume a avaliação inicial destes pacientes. A solicitação de exames deve ser ponderada conforme a suspeita clínica
.
A DHGNA merece atenção especial: a dosagem normal de transaminases não afasta o diagnóstico, e o grau de elevação não está associado ao grau de fibrose ou à gravidade da inflamação hepáticas. Quando as transaminases estão elevadas, é comum que a razão AST:ALT seja menor que 1. Isoladamente, a ALT tem sensibilidade de 72% e especificidade de 51% para diagnóstico de NASH (
nonalcoholic steatohepatitis
) em pacientes com esteatose. 

Tabela 2.
Investigação de diagnóstico diferencial de esteatose hepática (2,4,5). 

  • Consumo de álcool e outras drogas 
  • Exposição a medicações, toxinas, fitoterápicos, suplementos alimentares 
  • Peso, IMC, hábitos alimentares 
  • Comorbidades e história médica pregressa 
  • Hemograma completo 
  • Transaminases, fosfatase alcalina, bilirrubinas, albumina, tempo de protrombina 
  • Função renal 
  • Glicemia de jejum e hemoglobina glicada 
  • Sorologias para hepatites virais (HBsag, anti-HBs, anti-HBc, anti-HCV) 
  • Investigação de hemocromatose: metabolismo do ferro (ferritina, saturação da transferrina); conforme resultados, pesquisa de mutações no gene HFE) 
  • Investigação de hepatite: auto-imune fator antinuclear, anti-mitocôndria, anti-músculo liso; 
  • Em pacientes selecionados (suspeita clínica, jovens, história familiar): ceruloplasmina sérica (doença de Wilson), anti-transglutaminase (doença celíaca) e dosagem de alfa1-antitripsina (deficiência de alfa1-antitripsina). 

Exames de imagem 

A situação clínica mais comum é o paciente se apresentar com ultrassom de abdômen com esteatose feito por outras indicações. A ecografia de abdome usualmente é indicada como primeiro exame para investigar elevação de transaminases e na suspeita de esteatose hepática.  

Na ultrassonografia, os sinais de esteatose são aumento da ecogenicidade hepática em relação ao córtex renal e ao baço, além de indefinição dos contornos hepático e diafragmático.  

Na tomografia, a esteatose é identificada como atenuação do parênquima hepático inferior a 40 unidades Hounsfield (UH), ou pelo menos 10 UH a menos em relação ao baço.  

Tanto o ultrassom quanto a tomografia têm sensibilidade moderada (70-80%) para o diagnóstico de esteatose quando comparado com histologia. A ressonância magnética tem maior sensibilidade, mas seu uso na investigação é mais comum na suspeita de doenças de depósito (hemocromatose, doença de Wilson). 

Alguns pacientes se apresentam com infiltração gordurosa focais ou multifocais. Nestes casos, a avaliação diagnóstica é mais desafiadora: 

  1. lesões hepáticas primárias (hepatocarcinoma, adenoma, hiperplasia nodular focal), que em geral exercem efeito de massa, realçam com o contraste e podem apresentar focos de necrose ou hemorragia.  
  2. abscessos, metástases hipovasculares e linfoma podem ser confundidos com esteatose focal. Na suspeita, a revisão de características de impregnação por contraste na tomografia é útil. Ressonância magnética é um recurso adicional. Deve-se sempre correlacionar os achados de imagem com o contexto clínico do paciente. 

Quando indicar biópsia hepática?
 

A biópsia tem duas indicações em pacientes com esteatose hepática: (1) avaliação etiológica e (2) na avaliação de hepatite (esteatohepatite não-alcoólica) ou fibrose nos pacientes com DHGNA. Na avaliação etiológica, é possível identificar sinais que sugiram outras etiologias e, no caso da hemocromatose, quantificar a deposição de ferro no fígado.  

Quanto à avaliação de hepatite, deve-se ressaltar que a DHGNA engloba pacientes com e sem hepatite e cirrose. Para essa diferenciação, recomenda-se inicialmente utilizar marcadores indiretos como escores (
NAFLD score
e
FIB-4
) e elastografia.  

O
NAFLD score
tem sensibilidade de 90% para estágios F0-F2 se o escore for menor que −1.455, e especificidade 97% para estágios F3-F4 se o escore for maior que 0.675. A elastografia tem sensibilidade de até 92% para cirrose.  

Na indefinição quanto à presença de cirrose ou hepatite, a biópsia deve ser considerada, principalmente quando há risco muito elevado de esteatohepatite não-alcoólica e/ou fibrose. 

Resumo
 

  • Esteatose hepática é a deposição de triglicerídeos nos hepatócitos e é uma das alterações mais comuns em exames de imagem hepáticos. Na maioria das vezes, trata-se de um achado incidental em um paciente assintomático. 
  • As principais etiologias da esteatose hepática são doença hepática gordurosa alcoólica e não-alcoólica; apesar disso, outras causas devem ser avaliadas em um paciente com esteatose hepática. 
  • Para a maioria dos pacientes, a investigação etiológica inclui revisão de medicamentos, suplementos, fitoterápicos e chás naturais, investigação laboratorial de hepatites virais, hemocromatose e hepatite autoimune.  
  • A biópsia hepática é útil no contexto de doença hepática gordurosa não-alcoólica para avaliar fibrose, hepatite e descartar causas alternativas para a esteatose.