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Estridor na infância: possíveis causas e diagnósticos diferenciais

O estridor é definido como um som respiratório agudo causado por fluxo de ar turbulento através de uma via aérea parcialmente obstruída, tipicamente no trato respiratório superior (laringe, traqueia proximal ou estruturas supraglóticas). Costuma ser mais frequente na inspiração, sugerindo obstrução supraglótica ou glótica, mas pode ocorrer na expiração (obstrução subglótica ou traqueal) ou ser bifásico, dependendo do local e gravidade da obstrução.  

O estridor pode ser resultado de diversas condições congênitas e adquiridas. O diagnóstico é auxiliado pela consideração da idade do paciente, do início dos sintomas, sintomas associados e exames complementares. 

O reconhecimento precoce do estridor e sua diferenciação de outros sons respiratórios (como sibilos) são fundamentais para o manejo adequado e prevenção de complicações graves.  

Diferença entre estridor e outros ruídos respiratórios 

A principal diferença entre estridor e outros sons respiratórios, como sibilos e roncos, está na localização anatômica da obstrução e nas características acústicas dos sons: 

  • Estridor:
    som agudo, áspero, mais audível sobre o pescoço, associado à obstrução das vias aéreas extratorácicas (laringe, traqueia proximal). O estridor inspiratório sugere obstrução acima das cordas vocais; o estridor expiratório ou bifásico indica obstrução subglótica ou traqueal. Eventualmente é audível sem auxílio de estetoscópio. 
  • Sibilos:
    sons agudos suaves geralmente ouvidos na expiração, associados à obstrução das vias aéreas intratorácicas pequenas (brônquios), como na asma ou bronquiolite. São mais audíveis sobre o tórax do que sobre o pescoço e não estão relacionados à obstrução laríngea, mas sim com o estreitamento de brônquios/bronquíolos por líquido ou espasmos. 
  • Roncos:
    Sons graves, de baixa frequência, causados por secreções ou colapso das vias aéreas de grande calibre, geralmente audíveis durante a inspiração e expiração no tórax, são mais comuns em patologias das vias aéreas superiores ou médias. 

Causas mais comuns de estridor em crianças 
 

É possível pensar nas causas mais comuns do estridor separando por causas agudas e crônicas ou ainda pela idade do paciente  

Causas Agudas do Estridor 

As causas agudas do estridor incluem condições como crupe, traqueíte bacteriana, epiglotite, abscesso retrofaríngeo, aspiração de corpo estranho, abscesso peritonsilar, queimaduras das vias aéreas, anafilaxia, hipotermia terapêutica e complicações pós-extubação. 

Causas Crônicas do Estridor 

As causas crônicas do estridor incluem condições mais associadas a anomalias congênitas craniofaciais, ou ainda alterações anatômicas decorrentes de procedimentos como intubação prolongada, são exemplos dessas condições as síndromes de Pierre Robin ou Apert, macroglossia, que pode estar presente na Sindrome de Down, laringomalácia, membranas laríngeas, cistos laríngeos, fendas laríngeas, estenose subglótica, paralisia das cordas vocais, estenose traqueal, traqueomalácia, anel vascular, cistos broncogênicos, hemangiomas infantis, tumores, papilomatose respiratória e espasmo laríngeo hipocalcêmico.  

Conforme mencionado, a idade da criança também auxilia no direcionamento do diagnóstico, assim tempos as seguintes hipóteses para as variadas faixas etárias 

  • Neonatos:
    anormalidades congênitas, como laringomalácia, traqueomalácia e estenose subglótica, geralmente se manifestam no primeiro mês de vida. Cistos broncogênicos e fendas laríngeas podem se tornar aparentes na infância e na primeira infância. 
  • Bebês e crianças pequenas:
    as causas mais comuns nessa faixa etária são a crupe e a aspiração de corpo estranho. A epiglotite é incomum, mas ainda é uma possível causa. 
  • Crianças em idade escolar e adolescentes:
    essas crianças frequentemente enfrentam um risco aumentado de disfunção das cordas vocais e abscessos peritonsilares. 

Em indivíduos de todas as idades, é importante considerar anafilaxia e traqueíte bacteriana como fatores potenciais significativos.  

Avaliação clínica 
 

Em crianças, o estridor é um sinal clínico importante de obstrução das vias aéreas superiores e pode indicar condições potencialmente graves que requerem avaliação e manejo imediatos. Em situações de estridor agudo com desconforto respiratório significativo, a prioridade é garantir a via aérea e suporte ventilatório.  

A história clínica, conforme mencionado, deve considerar a idade de início dos sintomas e a idade do paciente. A presença de sintomas associados pode auxiliar indicando as possíveis causas do estridor.  

  • Urticária:
    urticária deve levar à avaliação de anafilaxia, que pode ser secundária a um gatilho alérgico. 
  • Tosse:
    a presença de tosse com latido é característica de crupe, que pode ser viral ou bacteriano. 
  • Desconforto respiratório:
    sinais de aumento de trabalho respiratório como taquipnéia, tiragem de fúrcula e batimento de asas nasais podem indicar crupe viral, traqueíte ou, em casos de associação com sibilos laringotraqueobronquite agudas 
  • Sialorreia:
    a existe salivação excessiva acompanhada de voz abafada, sugere que a obstrução é provavelmente supraglótica, como um abscesso retrofaríngeo ou epiglotite. Por outro lado, babar com disfagia pode indicar a possibilidade de aspiração de corpo estranho ou uma anormalidade externa comprimindo o esôfago. 
  • Estado mental:
    Um estado mental alterado, particularmente quando acompanhado por aumento do trabalho respiratório, pode servir como um sinal de alerta para uma perda iminente das vias aéreas. 
  • Estridor durante a alimentação:
    estridor durante a alimentação deve levar à consideração de fístula traqueoesofágica, refluxo gastroesofágico ou disfunção da deglutição como possíveis problemas subjacentes. 
  • Febre: Febre pode estar presente com crupe, epiglotite, traqueíte bacteriana e abscesso retrofaríngeo. Crianças que apresentam sinais de toxicidade e febre alta têm maior probabilidade de ter uma infecção bacteriana   

Exames complementares e quando indicar 
 

  • Hemograma:
    pode ser solicitado para avaliar contagem de leucócitos se houver suspeita de uma fonte bacteriana. Em casos de apresentação clássica de crupe, esse exame geralmente é desnecessário.  
  • Painel viral rápido:
    pode auxiliar na identificação presença de vírus em pacientes pediátricos que necessitam de hospitalização. 
  • Exames complementares
    , sobretudo de imagem, não devem ser a primeira etapa na avaliação aguda. Para estridor agudo, a radiografia pode causar atraso indevido no tratamento e deve ser evitada; a endoscopia é a investigação de escolha para casos crônicos ou recorrentes 
  • Radiografia: 
    antes de realizar esses exames é importante avaliar a criança em busca de sinais de insuficiência respiratória iminente. Se houver preocupações, é imperativo que pessoal treinado em manejo das vias aéreas acompanhe a criança até o departamento de radiologia. Pode ser solicitada uma radiografia cervical lateral simples para avaliar o tamanho do espaço retrofaríngeo, entretanto essa avaliação pode ser difícil. O "sinal da torre," atribuído a um arco subglótico edematoso, é o sinal radiográfico clássico e mais facilmente visualizado em uma vista anteroposterior do pescoço em crianças com crupe.  

Figura 1 - Estreitamento subglótico cônico das vias aéreas na radiografia, demonstrando o clássico “sinal da torre” no crupe. 

Embora aproximadamente 70% das crianças com epiglotite possam ter radiografias do pescoço normais, uma característica definidora da epiglotite é a presença de um "sinal do polegar" resultante do aumento da epiglote.

Figura 2 - Radiografia lateral do pescoço mostrando o espessamento da epiglote (seta fina) e das pregas ariepiglóticas (seta grossa) da epiglotite aguda.

A radiografia de tórax pode detectar massas mediastinais, linfadenopatia ou corpos estranhos. Notavelmente, uma radiografia torácica negativa não necessariamente exclui a possibilidade de um corpo estranho. Antes de realizar quaisquer estudos radiológicos, é importante avaliar a criança em busca de sinais de insuficiência respiratória iminente. Se houver preocupações, é imperativo que pessoal treinado em manejo das vias aéreas acompanhe a criança até o departamento de radiologia. 

A imagem é valiosa para delineamento anatômico em suspeitas de anomalias congênitas, massas (como laringoceles ou cistos saculares congênitos, hemangiomas) e compressões extrínsecas (por exemplo: anéis vasculares). 

Tomografias computadorizadas do tórax e pescoço podem revelar fontes potenciais de infecção, como celulite, lesões estenosantes e corpos estranhos. A ressonância magnética (RM) é uma ferramenta valiosa para distinguir a estenose traqueal em pacientes pediátricos. 

Ultrassonografia pode diferenciar massas císticas de sólidas, avaliar a mobilidade das cordas vocais e, em alguns casos, monitorar massas subglóticas 

Endoscopia flexível das vias aéreas é considerada a "ferramenta principal" e o "padrão-ouro" para a avaliação do estridor na maioria das circunstâncias. Especialistas a utilizam para avaliar o movimento dinâmico das estruturas laríngeas de forma rápida e confiável, muitas vezes sem sedação. Permite documentar o local e a extensão da obstrução e excluir outras causas. Deve ser realizada por um profissional experiente. 

Endoscopia rígida pode ser indicada para patologias glóticas ou subglóticas, proporcionando uma avaliação anatômica mais detalhada e permitindo manipulação. Pode ser útil para identificar e extrair corpos estranhos. É complementar à endoscopia flexível A laringoscopia e a broncoscopia podem ajudar a visualizar as vias aéreas para estabelecer um diagnóstico definitivo. Em casos em que o paciente se apresenta em estado crítico, ou quando se suspeita que a epiglote ou a traqueíte bacteriana sejam a causa do estridor, a intubação endotraqueal deve ser considerada prontamente. 

Conclusão 
 

O estridor é um sintoma presente em diversas patologias que podem acometer desde os recém-nascidos até as crianças maiores. A história clínica considerando idade de início, sintomas associados e evolução são fundamentais para que sejam formuladas hipóteses diagnósticas.

Em caso de recorrência ou cronicidade, deve ser investigado com exames complementares a fim de diagnosticar a causa e proceder o tratamento, se indicado. Em episódios agudos, em geral são decorrentes de crupe viral, e a depender dos sintomas associados pode ser necessário tratamento imediato, sobretudo em casos de desconforto respiratório importante.