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Hiperparatireoidismo primário: quadro clínico e diagnóstico diferencial

Hiperparatiroidismo primário é definido pelo excesso de produção de paratormônio (PTH) pelas glândulas paratireóides de forma autônoma (não regulada). A maioria dos casos (80%) é relacionado a um adenoma isolado, mas até 20% dos pacientes podem ter hiperplasia de mais de uma glândula paratireóide ao mesmo tempo. Tipicamente, é uma doença de mulheres e ocorre após os 45 anos. 

O PTH é o principal hormônio responsável pela regulação do metabolismo do cálcio e garante que a calcemia seja estável. Normalmente, é supresso por autorregulação negativa de níveis elevados de cálcio, o que ocorre em hipercalcemia não dependente de PTH (como na hipercalcemia da malignidade).

Os níveis baixos de cálcio, por outro lado, aumentam a síntese e a secreção de PTH; nesse cenário, os principais efeitos do hormônio ocorrem nos tecidos ósseo (onde estimula a reabsorção óssea, primeiro mecanismo para elevação da calcemia) e renal (onde aumenta a reabsorção de cálcio nos túbulos distais e a síntese de 1,25-dihidroxivitamina D nos túbulos proximais, principais mecanismos de manutenção da calcemia a longo prazo). 

O quadro "clássico" de um paciente com múltiplas fraturas, tumores ósseos marrons, é incomum atualmente, restrito a casos isolados de pacientes com pouco contato com o sistema de saúde ou pacientes com carcinoma de paratireóide.

O fenótipo clínico-laboratorial mais comum atualmente é de uma paciente com
hipercalcemia, hipercalciúria e PTH elevado,
com ou sem osteoporose ou história de cálculos renais prévios, com essas alterações identificadas na investigação de osteoporose ou por exames de rastreamento.  

Na identificação de um paciente com PTH elevado acompanhado de cálcio elevado, o diagnóstico da condição está definido. Um aspecto relevante adicional é que
exames de imagem (tradicionalmente cintilografia) não tem utilidade para firmar o diagnóstico do hiperparatireoidismo
; eles devem ser usados apenas após o diagnóstico estar firmado, para fins de planejamento cirúrgico.

Apesar do papel central do laboratório no diagnóstico do hiperparatireoidismo, é comum os exames terem valores limítrofes (um pouco acima ou abaixo do valor de referência) e isso gerar dúvida no médico. Portanto, é importante para compreensão e diagnóstico desses pacientes e interpretação dessas alterações laboratoriais, um conhecimento dos diagnósticos diferenciais e de seus possíveis quadros clínico-laboratoriais.

Iniciaremos apresentando as principais doenças relacionadas a alterações do metabolismo do cálcio e depois proporemos abordagens para pacientes com alterações laboratoriais específicas.  

Principais situações clínicas
 

As principais condições ou doenças que estão relacionadas ao hiperparatireoidismo primário estão apresentadas na
Tabela 1
. Além disso, a
Figura 1
apresenta visualmente o comportamento do cálcio e PTH séricos nas doenças discutidas aqui; trata-se de uma aproximação, mas ela é muito útil para observar-se que há sobreposição entre as diferentes situações clínicas. De forma resumida deve-se atentar que: 

  1. O hiperparatireoidismo primário indica uma hiperprodução de PTH autônoma (independente do nível de cálcio); 
  2. O hiperparatireoidismo primário normocalcêmico é uma variação do quadro tradicional, mas em que há o mesmo mecanismo fisiopatológico. É necessário descartar a presença de hiperparatireoidismo secundário para fazer seu diagnóstico; 
  3. A hipercalcemia hipocalciúrica familiar é laboratorialmente sobreponível ao hiperparatireoidismo primário, porém se diferencia pela presença de hipocalciúria marcada; 
  4. O hiperparatireoidismo secundário está associado com outros distúrbios no metabolismo do cálcio que culminam com uma resposta
    fisiológica de aumento do PTH
  5. A hipercalcemia da malignidade (ou relacionada a doenças granulomatosas) está associada com um outro estímulo para acúmulo de cálcio (seja hiperprodução de molécula análoga ao PTH oude vitamina D) e, portanto, o PTH está reduzido. 

 
Tabela 1.
Hiperparatireoidismo e seus principais diagnósticos diferenciais. Adaptado de (2,4). 

Figura 1.
Distribuição dos valores de cálcio e PTH séricos de acordo com as diferentes doenças. Adaptado de (5).

Além desses fatores, um aspecto importante a se lembrar é que o PTH é também um hormônio fosfatúrico. Dessa forma, a hipofosfatemia e a hiperfosfatúria são marcadores indiretos de sua hiperfunção. A fosfatúria pode ser avaliada através da estimativa da taxa de reabsorção de fósforo (TRP) (
Quadro 1
), em que valores < 83% sugerem hiperparatireoidismo (ou excesso de PTH de outras origens). Essa informação também é útil na avaliação da hipercalcemia com PTH reduzido (suspeita de malignidade), em que fósforo e TRP reduzidos indicam malignidade com produção de PTH análogo. 

Quadro 1.
Taxa de reabosrção de fósforo
(2)

Como abordar paciente com cálcio alto?
 

Na abordagem de um paciente com hipercalcemia, o PTH tem papel central na definição da etiologia. Foge do escopo deste texto aprofundar a investigação das causas de hipercalcemia não dependentes de PTH, mas apresentamos uma abordagem simplificada no fluxograma abaixo (
Figura 2
).  

Figura 2.
Fluxograma simplificado de abordagem do paciente com hipercalcemia. Adaptado de (1,2). 

Conforme já discutido, na presença de hipercalcemia e PTH elevado, o diagnóstico de hiperparatireoidismo está praticamente estabelecido. Como até 20% dos pacientes com hipercalcemia hipocalciúrica familiar podem ter elevações leves de PTH, deve-se atentar para esse diagnóstico antes de se definir pela abordagem terapêutica.

Uma dosagem de cálcio em urina de 24 horas (< 100 mg/24 horas indica hipocalciúria familiar), ou, pela maior comodidade, uma avaliação em amostra de urina da relação cálcio/creatinina (> 0,02 indicando hiperparatireoidismo) são suficientes para a diferenciação. 

Como abordar paciente com PTH alto?
 

Um desafio clínico diferente (e com recomendações menos claras na literatura) são aqueles pacientes que se apresentam com PTH elevado de forma isolada, com cálcio sérico normal.

Esses pacientes provavelmente encontram-se na situação de sobreposição demonstrada na
Figura 1
e discutida anteriormente. O mais provável é que sejam pacientes com uma causa secundária para elevação do PTH. Nessas situações, a repetição de exames para confirmar a alteração e observar se há alguma tendência de elevação ou redução podem ser úteis.  

As três causas principais de hiperparatireoidismo secundário são deficiência de vitamina D (que deve ser dosada diretamente), perda de função renal (avaliar em conjunto creatinina sérica e baixa ingestão ou absorção de cálcio.

Para esta última situação,
revisão da dieta, história de cirurgia e análise de calciúria
. Hiperparatireoidismo primário normocalcêmico deve ser considerado naqueles pacientes em que nenhuma causa para elevação do PTH e, especialmente, se o cálcio estiver próximo do limite superior e fósforo e TRP com tendência à redução.   

Resumo

  • Hiperparatireoidismo primário é identificado pela presença de cálcio e PTH elevados na ausência de hipocalciúria marcada. 
  • Os principais diagnósticos diferenciais são condições que cursam com hipercalcemia ou PTH elevado isoladamente. 
  • As causas da hipercalcemia são várias, mas o primeiro passo na avaliação desses pacientes é verificar o PTH e a calciúria. Com esses exames é possível diferenciar hiperparatireoidismo de outras causas. 
  • Nos pacientes com PTH elevado sem hipercalcemia deve-se avaliar elevações secundárias desse hormônio, como deficiência de vitamina D, insuficiência renal e defeitos na absorção do cálcio. Hiperparatireoidismo primário normocalcêmico é um diagnóstico a ser considerado, após descartar as causas acima. 

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