Oclusão coronariana: como identificar e peculiaridades da síndrome de Wellens

Infarto agudo do miocárdio (IAM) é uma das principais causas de morte no mundo e responsável por grande comprometimento da qualidade de vida das pessoas acometidas. Um dos principais passos do cuidado é fazer o diagnóstico correto, como vimos
nesta postagem
; nela você também encontra dicas sobre o manejo. A diferenciação entre IAM com e sem supradenivelamento de segmento ST também é muito importante para decisões de tratamento, principalmente por definir indicação de trombólise ou cateterismo imediatos.
Neste sentido, a principal ferramenta diagnóstica na suspeita de síndrome coronariana aguda (junto com a dosagem de troponina) é a realização de eletrocardiograma (ECG). O básico na avaliação do ECG é identificar supradenivelamento do segmento ST. Apesar do papel central dessa classificação, nos últimos anos está ficando claro e ganhando mais atenção na literatura médica que esta não é a única manifestação eletrocardiográfica de oclusão coronariana aguda.
Assim, nesta postagem vamos revisar o conceito de infarto do miocárdio oclusivo e conhecer um dos seus padrões de apresentação, chamado de padrão eletrocardiográfico (ou síndrome) de Wellens.
Infarto do miocárdio oclusivo
O infarto do miocárdio oclusivo ou oclusão coronariana aguda é um novo modelo de compreensão (ou seja, um novo paradigma ou teoria) das síndromes coronarianas aguda. Ele está baseado que pacientes sem elevação de segmento ST podem ter oclusão coronariana e evolução bastante desfavorável e, assim, deve-se reconsiderar o conceito de que apenas os pacientes com elevação do segmento ST necessitam de revascularização. Ou seja, o benefício da revascularização é esperado para todas as pessoas com oclusão aguda de uma coronária, mas estima-se que entre 25 e 35% destes pacientes não tenham o clássico “supra de ST".
Nesta nova teoria, deveria-se migrar de uma avaliação centrada no segmento ST para uma avaliação multimodal, que leve em conta diferentes marcadores de oclusão coronariana. Isso passaria pela busca de segmento ST no ECG, mas também por outras alterações eletrocardiográficas, como os padrões de Wellens e de Winter, padrão da bandeira da África do Sul, entre outras. Também entraria neste processo diagnóstico o uso disseminado de ultrassonografia à beira do leito, tomografia computadorizada coronariana e algortimos de inteligência artificial para identificação de novos padrões no eletrocardiograma.
Vale destacar que trata-se de uma discussão bastante atual na literatura médica, longe de estar definida. Independente disso, o médico atendendo pacientes com suspeita de IAM deve saber que os dados são claros em indicar que
uma fração significativa pacientes sem elevação de segmento ST podem ter evolução desfavorável e necessitar de estratégia invasiva precoce
– mesmo sendo classificados como IAM sem supra. E, neste sentido, a proposta é que, para pacientes com angina aguda sem os critérios clássicos de supradesnivelamento de ST
mantenha-se atenção a outros padrões de ECG que indiquem oclusão coronariana, como a síndrome de Wellens.
A síndrome de Wellens
A síndrome de Wellens foi descrita por um grupo de médicos holandeses (liderados pelo prof Hein J.J. Wellens) em 1982 e é caracterizada por um padrão eletrocardiográfico de inversões profundas de onda T (“coronarianas”) nas derivações V2 e V3 (de coronária descendente anterior). Por isso, também é conhecida como síndrome da onda T coronariana da artéria descendente anterior.
Este padrão está associado com estenoses graves de artéria descendente anterior e é considerado um estado de “pré-infarto". Acredita-se que os achados indiquem uma oclusão coronariana que evoluiu com reperfusão espontânea rápida em que o momento preciso do fechamento do vaso não foi documentado no ECG. Na descrição inicial do quadro observou-se que pacientes com esse achado evoluiam negativamente em poucas semanas quando não eram submetidos a terapia de reperfusão.
Pode haver, junto com as alterações típicas, haver outros achados ECG, como ondas T bifásicas em V1, V2 e derivações direitas. Os achados de onda T profundas pode acometer também de V1 até V5. Além dos achados de ECG, faz parte da síndrome a presença de biomarcadores normais ou levemente alterados, história de dor torácica antes do atendimento, mas ausência da mesma no momento agudo – aspectos que corroboram a teoria de recanalização rápida de uma oclusão da artéria descendente anterior.
Propõem-se, como critérios diagnóstico da síndrome:
- Ondas T profundamente invertidas (padrão B)OUondas T bifásicas (com positividade inicial e negatividade terminal – padrão A) nas derivações V2 e V3 -Figura 1.
associado com:
- Ausência de sinais eletrocardiográficos de IAM agudo de parede anterior; ou seja, segmento ST na linha de base ou minimamente elevado (< 1 mm)
- Ausência de sinais de IAM antigo na parede anterior; ou seja, progressão normal da onda R nas derivações precordiaisEausência de ondas Q nas precordiais
- História recente de angina.
- Padrão no ECG presente em estado sem dor.
- Marcadores cardíacos normais ou levemente elevados.
Figura 1.
Exemplo dos achados do padrão / síndrome de Wellens. Extraído da referência 4.

Como pode-se depreender da discussão sobre oclusão coronariana aguda, na suspeita deste padrão, deve-se realizar consultoria com cardiologista e considerar estratégia invasiva precoce visando tratar a artéria acometida (descendente anterior). Enquanto aguarda-se a cateterismo e, uma vez confirmado o diagnóstico de IAM, o restante do manejo segue as recomendações usuais de síndrome coronariana aguda.