Oclusão coronariana: o padrão eletrocardiográfico de "de Winter"

No infarto agudo do miocárdio (IAM), a adequada classificação diagnóstica é um dos principais passos para o manejo. Um aspecto central dessa avaliação é a identificação de pacientes de alto risco e com maior chance de se beneficiar de estratégias de revascularização. Tradicionalmente, utiliza-se para esse fim a presença ou ausência de elevação do segmento ST.
Nos últimos anos, entretanto, surgiu um novo conceito: o IAM oclusivo. Esse conceito baseia-se na ideia de que outras formas graves de síndrome coronariana aguda podem ocorrer, mesmo sem elevação do segmento ST. Uma destas apresentações é o padrão eletrocardiográfico de
de Winter
. Ele é um dos marcadores de oclusão coronariana e este sinal é uma das maneiras de localizar pacientes candidatos a estratégias de reperfusão.
Para mais informações sobre diagnóstico e manejo de síndrome coronariana aguda, há uma revisão rápida do assunto
nesta postagem
.
O padrão
de Winter
foi descrito relativamente há poucos anos (2008) pelo médico holandês Robbert J. de Winter, em colaboração com outros colegas, entre eles o professor Hein J.J. Wellens, que descreveu em 1982 o padrão conhecido como síndrome de Wellens – revisado em outra postagem do nosso blog.
Este texto apresenta uma breve revisão do novo conceito de IAM oclusivo e após veremos como identificar o padrão eletrocardiográfico de
de Winter
.
Infarto do miocárdio oclusivo
O paradigma de infarto do miocárdio oclusivo, ou oclusão coronariana aguda, propõe um novo entendimento das síndromes coronarianas agudas. Essa abordagem propõem uma evolução da divisão atual em infarto com e sem supradesnivelamento de segmento ST; que, por sua vez, é uma evolução do infarto com e sem ondas Q.
A teoria da oclusão arterial aguda se baseia no conhecimento que pacientes sem elevação do segmento ST também podem apresentar oclusão em uma artéria coronária e estar sob alto risco de complicações graves – e também potencialmente se beneficiarem de revascularização (trombólise ou cateterismo). Por isso, o conceito tradicional que restringe a indicação de revascularização apenas àqueles com elevação do segmento ST, precisaria ser revisado. Evidências indicam que mais de um quarto dos indivíduos com oclusão coronariana aguda não apresentam o padrão clássico de “supra de ST”. Dentro dessa nova perspectiva, a avaliação deve ir além do segmento ST no eletrocardiograma, atentando-se também a achados como os padrões de supradesnivelamento difuso sutil do segmento ST, Aslanger e
de Winter
, entre outros. Está bem estabelecido que eles indicam lesões de alto risco e oclusão mesmo na ausência de elevação do ST. Especula-se que no futuro outros critérios farão parte do diagnóstico, com especial interesse com o uso crescente de ecocardiograma realizado à beira do leito e algoritmos de inteligência artificial para facilitar a interpretação (e identificar novos padrões) no ECG.
Embora esse modelo ainda esteja em debate na comunidade médica e não haja um consenso consolidado, já se sabe que
uma parcela significativa dos pacientes sem elevação do segmento ST pode ter desfechos desfavoráveis e demandar intervenção invasiva precoce. Assim, é essencial que médicos estejam atentos a padrões eletrocardiográficos menos conhecidos e outros sinais de oclusão coronariana em casos de angina aguda
. A identificação desses indicadores pode ser decisiva para melhorar o manejo e o prognóstico de pacientes com eventos cardíacos graves.
Padrão de
de Winter
O padrão (ou sinal) de
de Winter
é caracterizado por um infradesnivelamento de segmento ST de 1-3 mm no ponto J com padrão ascendente e acompanhado de ondas T elevadas, positivas e simétricas. Este padrão pode estar presente 2 ou mais das derivações precordiais (de V1 a V6), mas é mais comum em V2 e V3. Em V3 costuma ter o pico da onda T tende a ser mais alto. Também é esperada elevação do segmento ST de 1-2 mm na derivação aVR. O QRS tem duração normal ou levementa aumentada e pode haver perda da progressão normal da onda R. Uma diferença deste padrão com o padrão de ondas T hipergudas, é que no
de Winter
o achado é persistente, sendo encontrado desde o ECG inicial até o realizado imediatamente antes do cateterismo.
Vale destacar que o ECG não pode apresentar elevação do segmento ST para fechar os critérios de
de Winter
. Estima-se que ele esteja presente em 2% dos pacientes com IAM da região anterior. O mecanismo que explica este sinal eletrocardiográfico ainda não está definido. Na
Figura 1
há exemplos do padrão, extraídos do artigo que descreveu o mesmo a primeira vez.
Figura 1.
Exemplos de padrão de
de Winter
. Notar em especial as derivações V2-V3 e aVR. Extraído da referência 4.

O padrão de
de Winter
é considerado um equivalente de supradenivelamento de segmento ST (ou seja, um IAM oclusivo). Ele é bastante específico (mas pouco sensível) para acometimento da artéria descendente anterior. Ainda assim, ele pode ser encontrado no acometimento de outras artérias. Em suma, o manejo deve ser contato imediato com serviço de hemodinâmica para realização de cateterismo e angioplastia (e stent) de forma urgente. Ou seja, o tratamento é equivalente ao manejo dos pacientes com IAM com supra de ST.
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