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Puberdade tardia:  avaliação clínica, diagnóstico diferencial e manejo

A puberdade é um processo natural de desenvolvimento físico e hormonal que marca a transição da infância para a adolescência. O início da puberdade, geralmente, ocorre entre 8 e 13 anos nas meninas e entre 9 e 14 anos nos meninos. Quando esses eventos se atrasam além das idades esperadas, surge a condição chamada de puberdade tardia, que é definida, portanto, como a ausência de sinais puberais até os 13 anos nas meninas e 14 anos nos meninos.  

A ausência de desenvolvimento das características sexuais secundárias, como o crescimento das mamas nas meninas ou o aumento testicular nos meninos, é um dos primeiros sinais de que o processo puberal está atrasado. 

O atraso no diagnóstico pode resultar em baixa estatura na vida adulta, além de impactar negativamente a autoestima e o bem-estar psicológico. O manejo oportuno também pode prevenir ou tratar causas patológicas subjacentes, como distúrbios hormonais ou genéticos. 

Avaliação clínica da puberdade tardia
 

Sinais e sintomas 
 

Os primeiros sinais de puberdade tardia incluem a ausência de desenvolvimento das características sexuais secundárias. Nas meninas, isso inclui a falta de aumento das mamas e do crescimento pubiano. Nos meninos, o aumento testicular (maior que 4 mL de volume) é o primeiro sinal de puberdade; sua ausência sugere atraso. Além da idade de início, o ritmo de progressão dos caracteres sexuais secundários também merece atenção, sendo que o período de desenvolvimento superior a 3,5-5 anos até a menarca ou volume testicular adulto (20-25mL) também indicam necessidade de investigação. 

Além da ausência de sinais sexuais, o atraso no crescimento é um marcador importante. Crianças com puberdade tardia podem apresentar uma estatura significativamente abaixo da média para sua idade.  

A puberdade tardia pode ter um impacto emocional significativo. Crianças e adolescentes que experimentam essa condição frequentemente se sentem diferentes dos seus pares de idade semelhante, o que pode levar a baixa autoestima, isolamento social e, em alguns casos, depressão e ansiedade. 

Exames clínicos e históricos médicos relevantes
 

A avaliação clínica deve incluir uma anamnese detalhada e um exame físico completo. É importante perguntar sobre uso de medicamentos e hábitos alimentares, marcos do desenvolvimento puberal, presença de doenças crônicas, estatura dos pais, presença ou não de consanguinidade e histórico de desenvolvimento puberal dos pais.  

Pais ou irmãos que experimentaram puberdade atrasada podem sugerir uma condição hereditária, conhecida como puberdade tardia constitucional, uma das causas mais comuns de atraso no desenvolvimento puberal. Deve-se ainda investigar se há casos de infertilidade na família.  

Um dos dados mais importantes é a avaliação do padrão de crescimento através do gráfico da própria criança ao longo do tempo. Em geral, utilizamos os gráficos da OMS para sexo e idade que avaliam o peso até os 10 anos, estatura de 5 a 19 anos e IMC de 5 a 19 anos. Particularmente, o gráfico de Tanner (velocidade de crescimento) é muito importante nesses casos, ele ajuda a avaliar a maturidade de acordo com a velocidade de crescimento. Os gráficos de crescimento variados podem ser encontrados e baixados
neste site aqui
.

No exame físico, deve-se avaliar cuidadosamente: peso, estatura, segmento superior e inferior, envergadura, desvios fenotípicos e o estádio puberal. Quando há suspeita do diagnóstico de atraso de desenvolvimento puberal, é importante avaliar a maturidade óssea por meio de exames de imagem, bem como, realizar exames laboratoriais.  

A investigação deve incluir exames laboratoriais gerais (suspeita de doenças crônicas subjacentes) como: hemograma completo, velocidade de hemossedimentação, função renal e hepática, eletrólitos, bioquímica do cálcio, gasometria, triagem para doença celíaca.  

Deve-se também dosar níveis hormonais de gonadotrofinas, como hormônio luteinizante (LH), hormônio folículo-estimulante (FSH), esteroides sexuais como estradiol (nas meninas), testosterona (nos meninos) e hormônio de crescimento.  

A radiografia de mão e punho é útil para determinar a idade óssea e avaliar o potencial de e crescimento restante. Exames de imagem, como a ressonância magnética do crânio, podem ser indicados se houver suspeita de lesão hipotalâmica ou hipofisária. 

Raciocínio diagnóstico 
 

A partir da avaliação clínica e laboratorial geral e das concentrações séricas das gonadotrofinas, estabelecem-se dois grupos:  

  • (1) diminuídas, situação em que se deve considerar causas funcionais, como o retardo constitucional do crescimento e da puberdade (RCCP) e causas secundárias a doenças crônicas, além do hipogonadismo hipogonadotrófico  
  • ou (2) elevadas, indicando falência primária da gônada (hipogonadismo hipergonadotrófico).

Retardo constitucional do crescimento e da puberdade (RCCP) 

É a causa mais frequente de atraso puberal temporário, considerada uma variante da normalidade. Neste grupo, as crianças apresentam estatura e velocidade de crescimento inadequadas para a idade cronológica (IC), mas compatíveis com a idade óssea (IO), que é atrasada. Os períodos de crescimento e maturação são mais lentos e é comum casos semelhantes na família.  

Algumas condições estão associadas ao RCCP, como diabetes mellitus, hipotireoidismo, doenças intestinais, hepáticas, renais, cardíacas, pulmonares ou hematológicas (causas que podem ser avaliadas pelos exames gerais anteriormente mencionados). O distúrbio nutricional da anorexia nervosa ou o gasto energético excessivo dos atletas/bailarinos também podem atrasar o desenvolvimento puberal. A deficiência isolada de hormônio do crescimento (GH) constitui um diagnóstico diferencial importante, já que ambas as condições comprometem a velocidade de crescimento e a maturação óssea. 

Hipogonadismo hipogonadotrófico 

Representa um grupo de patologias com comprometimento hipotalâmico e/ou hipofisário que resulta na deficiência de gonadotrofinas. Causado por defeitos genéticos, que alteram o desenvolvimento hipotalâmico/hipofisário, ou adquiridos, após lesão inflamatória, infecciosa, traumática ou tumoral, por exemplo, no craniofaringioma ou germinoma selar, podendo se associar a outras deficiências adeno-hipofisárias. Neste grupo, a ressonância magnética (RM) de crânio/hipófise é um exame importante.  

O diagnóstico diferencial entre RCCP e hipogonadismo hipogonadotrófico é, geralmente, muito difícil.  Clinicamente, os pacientes com deficiência de gonadotrofinas apresentam, até o período puberal, estatura e IO proporcionais à IC, contrastando com aqueles com RCCP. Como a secreção dos esteroides gonadais está comprometida, a velocidade de crescimento é diminuída e existe um prolongamento do período de crescimento, o que leva à alta estatura com proporções eunucoides.  

A distinção entre o RCCP e hipogonadismo hipogonadotrófico, em geral, se faz apenas com o seguimento clínico, não existindo nenhum sinal ou exame laboratorial, até o momento, que possa diferenciar estas duas condições. O hipogonadismo hipogonadotrófico também pode estar associado a síndromes genéticas.  

Hiponogadismo hipergonadotrófico 

Caracterizado pelas concentrações elevadas de gonadotrofinas, em resposta à falência gonadal. Neste grupo, o cariótipo é um exame importante para afastar alterações dos cromossomos sexuais. A síndrome de Klinefelter é a forma mais frequente, no sexo masculino. O cariótipo mais comum é 47, XXY. A puberdade pode se iniciar na idade adequada, mas não evolui de forma apropriada. 

 As alterações fenotípicas incluem alta estatura, proporções eunucoides, micropênis, testículos pequenos e endurecidos e ginecomastia. A capacidade intelectual é geralmente limitada, assim como a adaptação social. A síndrome de Turner é a causa mais frequente, no sexo feminino. Caracteriza-se pelo cariótipo 45, X0 e mosaicismos, disgenesia gonadal e alterações fenotípicas, tais como baixa estatura, pescoço curto e alado, implantação baixa da linha do cabelo, cúbito valgo, anormalidades renais e cardíacas. As concentrações das gonadotrofinas séricas são extremamente altas entre o nascimento e quatro anos de idade, diminuem no período pré-puberal e tornam a se elevar por volta dos 10 anos, em especial o FSH.  

As disgenesias gonadais, os defeitos de síntese de esteroides sexuais, as insensibilidades androgênicas e outros distúrbios da diferenciação sexual também podem resultar em hipogonadismo hipergonadotrófico. As causas adquiridas englobam a falência gonadal após quimioterapia com agentes alquilantes e/ou radioterapia da pelve. Causas inflamatórias, infecciosas ou autoimunes também devem ser consideradas. 

Como é possível observar, o diagnóstico da causa específica é desafiador, sendo indicada avaliação por especialista em endocrinologia pediátrica. 

Manejo da puberdade tardia
 

Abordagem inicial e acompanhamento
 

O manejo inicial da puberdade tardia inclui a observação cuidadosa e o acompanhamento regular. Em casos de puberdade tardia constitucional, pode-se adotar uma abordagem expectante, pois o desenvolvimento puberal tende a ocorrer de forma espontânea. É importante garantir suporte emocional à criança e à família, reforçando que o atraso geralmente é temporário.  

O tratamento em si depende da causa base, pode envolver observação expectante ou terapia com esteroides sexuais de baixa dosagem. Quando o tratamento medicamentoso é administrado, os objetivos são induzir o aparecimento de características sexuais secundárias ou a aceleração do crescimento e atenuar as dificuldades psicossociais associadas ao atraso puberal e à baixa estatura. 

Nos casos de RCCP, o tratamento, normalmente, não é necessário e o enfoque deve ser o desenvolvimento da criança, considerando sua velocidade de crescimento, reassegurando-a de seu bom prognóstico de amadurecimento e estatura final.  

Nos casos de hipogonadismo hipo- ou hipergonadotrófico, faz-se a indução da puberdade e a manutenção dos caracteres sexuais secundários com esteroides sexuais: estrógeno (no sexo feminino) ou testosterona (no sexo masculino). Em meninos, a terapia com baixas doses de testosterona pode ser utilizada para iniciar o processo puberal. Em meninas, a terapia com estrógeno pode ser indicada.  

O impacto psicossocial da puberdade tardia pode ser profundo, afetando a autoimagem e o relacionamento social da criança. Por esse motivo o suporte psicológico é uma parte importante do tratamento. Grupos de apoio e aconselhamento familiar podem ser recomendados para ajudar a criança a lidar com os desafios emocionais associados ao atraso no desenvolvimento. 

Conclusão
 

A puberdade tardia é uma condição relativamente comum, que pode ter várias causas fisiológicas ou patológicas. O diagnóstico precoce e o manejo adequado ajudam a garantir que a criança tenha um desenvolvimento físico, emocional e social saudável.  

O envolvimento de uma equipe multidisciplinar, incluindo pediatras, endocrinologistas pediátricos e psicólogos, é de extrema importância para que o cuidado seja abrangente e individualizado.  

O tratamento deve ser individualizado, com base na causa subjacente e na resposta ao tratamento e ser acompanhado por especialista com experiência no uso dessas terapias. 

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