Síndrome de Burnout entre profissionais de enfermagem: panorama e desafios

A Organização Mundial da Saúde (OMS) descreve o Burnout como “uma síndrome resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito” e que se caracteriza por três elementos: “sensação de esgotamento, cinismo ou sentimentos negativos relacionados ao trabalho e eficácia profissional reduzida”.
A definição mais aceita sobre a Síndrome de Burnout fundamenta-se na perspectiva social-psicológica de Maslach & Jackson (1981). Essa definição considera o Burnout como uma reação à tensão emocional crônica decorrente do contato excessivo com pessoas. Trata-se de um construto formado por três dimensões relacionadas, mas independentes:
- (a)Exaustão emocional: caracterizada pela falta de energia e entusiasmo, bem como pela sensação de esgotamento de recursos, à qual pode somar-se o sentimento de frustração e tensão dos trabalhadores, ao perceberem que já não têm condições de despender mais energia para o atendimento de seus clientes ou demais pessoas, como faziam antes;
- (b)Despersonalização: caracterizada pelo desenvolvimento de uma insensibilidade emocional, que leva o profissional a tratar clientes, colegas e a organização de maneira desumanizada;
- (c)Diminuição da realização pessoal no trabalho: caracterizada por uma tendência do trabalhador a autoavaliar-se de forma negativa, tornando-se infeliz e insatisfeito com seu desenvolvimento profissional, com consequente declínio no sentimento de competência e êxito, bem como em sua capacidade de interagir com os demais.
O Burnout já é tratado como doença ocupacional na nova Classificação Internacional de Doenças (CID) da OMS, e, desde 1º de janeiro de 2022, o código QD85 da CID-11 identifica a Síndrome de Burnout.
Assim, devido às suas consequências, a Síndrome de Burnout é um problema de saúde pública que tem despertado considerável interesse e preocupação na comunidade científica e nas organizações.
Burnout e a Enfermagem
De acordo com a literatura, os profissionais de saúde são os mais afetados pela Síndrome de Burnout, sendo os enfermeiros os que apresentam a maior prevalência. Vários fatores contribuem para esse fenômeno, independentemente do ambiente de trabalho, incluindo características sociodemográficas, ocupacionais e pessoais, assim como as inter-relações estabelecidas.
O contexto do cuidado de enfermagem envolve uma rotina de trabalho desgastante, com altas demandas, imprevisibilidades, convivência com sofrimento e morte, horários inflexíveis, sobrecarga de trabalho devido ao número insuficiente de profissionais, baixa remuneração, pouco apoio dos colegas e desvalorização profissional. A gravidade do estado dos pacientes e o cuidado complexo prestado pelos profissionais de enfermagem aumentam o desgaste mental, contribuindo ainda mais para o sofrimento no trabalho.
Além disso, o enfermeiro, além de vivenciar o sofrimento de pacientes internados nas unidades de saúde, também é responsável por acolher as famílias em momentos de fragilidade, o que exige ampla responsabilidade. O impacto do trabalho na saúde física e mental desses profissionais pode levar à insatisfação e à exaustão, afetando a qualidade dos serviços prestados, bem como a saúde do próprio profissional.
É importante ressaltar que a tensão emocional relacionada ao trabalho faz parte de um processo crônico, que pode se perpetuar por anos. O estresse chega às últimas consequências e leva o organismo ao esgotamento por exaustão. Clinicamente, o indivíduo pode tornar-se improdutivo, irresponsável, indiferente, desatencioso, emocionalmente frio e empobrecido em seus vínculos afetivos e laborais.
Estratégias de Prevenção do Burnout
A prevenção da Síndrome de Burnout nos enfermeiros passa pela adoção de estratégias tanto no nível individual quanto organizacional. O enfermeiro, enquanto indivíduo, deve desenvolver a capacidade de autocontrole do estresse e de autorreconhecimento dos sinais e sintomas do Burnout, com o objetivo de promover sua saúde mental e bem-estar. Já a organização deve desempenhar um papel essencial na prevenção, criando condições para um ambiente de trabalho mais saudável e menos propenso ao estresse.
Estratégias de prevenção
- Gerenciar o tempo de forma saudável, priorizando as tarefas mais importantes;
- Estabelecer intervalos regulares e respeitar os horários de descanso;
- Desconectar-se do trabalho fora do expediente;
- Manter uma rotina saudável, com exercícios físicos e dieta balanceada;
- Procurar ajuda profissional;
- Receber apoio dos colegas e da equipe.
Intervenções psicológicas
- Terapia cognitivo-comportamental para ajudar a lidar com pensamentos e comportamentos negativos;
- Meditação;
- Programa de gerenciamento de estresse baseado na web;
- Programa de empoderamento psicológico.
Suporte social
- Melhoria das relações sociais;
- Fornecimento de informações úteis para orientar os colaboradores em suas atividades laborais.
Estratégias como o desenvolvimento da resiliência, a prática de yoga, a promoção do autocuidado, o comprometimento organizacional e o incentivo à saúde mental têm sido aplicadas na prática. Equipes de enfermagem com maior capacitação em saúde mental conseguem desempenhar suas funções com mais qualidade e eficácia.
Essas estratégias visam reverter o aumento exponencial do Burnout na sociedade atual e permitir que as instituições de saúde tenham enfermeiros que, além de altamente dedicados, estejam motivados e satisfeitos com sua atividade profissional.
Norma Regulamentadora 1 Atualizada (NR-1)
A NR-1 é um conjunto de diretrizes criadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego para assegurar condições adequadas de saúde e segurança no ambiente de trabalho. A nova NR-1, revisada pela Portaria nº 1.419 e publicada em 27 de agosto de 2024, exige que as organizações incluam os riscos psicossociais no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), que integra o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO).
A partir de maio de 2025, as empresas brasileiras serão obrigadas a cuidar da saúde mental de seus funcionários. Isso significa que elas passam a ser responsáveis por garantir que o ambiente de trabalho não seja uma fonte de adoecimento mental devido à sobrecarga ou a ambientes tóxicos. Antes da atualização da NR-1, apenas os riscos físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e de acidentes eram contemplados pela norma reguladora.
O que a lei exige?
- Identificar e mitigar riscos psicossociais no ambiente de trabalho;
- Monitorar e tratar fatores que afetam a saúde emocional dos trabalhadores;
- Criar ações para evitar problemas de saúde mental, como excesso de trabalho ou assédio.
O que as empresas podem fazer?
- Treinar os funcionários sobre saúde mental e como lidar com o estresse;
- Criar um ambiente de trabalho positivo;
- Valorizar o bem-estar dos funcionários;
- Organizar o trabalho de forma equilibrada.
O que acontece se a empresa não cumprir a lei?
- Multas;
- Embargo ou interdição das atividades da empresa;
- Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ou com o Ministério Público do Trabalho (MPT);
- Ações contra empresas que desrespeitem as normas de segurança e saúde no trabalho.