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Diretriz de hipertensão arterial da ESC 2024: as três principais mudanças

A sociedade europeia de cardiologia (
European Society of Cardiology
[ESC]) produz diretrizes (
guidelines
) há mais de 30 anos que ajudam os médicos a decidir quais investigações e tratamentos realizar ou não realizar para seus pacientes. De tempos em tempos essas diretrizes são revisadas e, neste ano, o
guideline
de hipertensão arterial sistêmica (HAS) foi atualizado em relação ao documento de 2018. Nesta postagem, vamos destacar e comentar as principais novidades.   

Vale destacar que se trata de um documento extenso com diversas informações valiosas e nem todas poderão ser abordadas nesta postagem. Se você quiser ler o documento na íntegra, pode localizá-lo
aqui
.  

Definição de hipertensão
 

As mudanças nestes aspectos são provavelmente as mais relevantes da atual diretriz. Conforme apresentado na
Figura 1
, pressão arterial abaixo de 120 mmHg de sistólica e de 70 mmHg de diastólica são consideradas não elevadas; para medidas em consultório valores iguais ou acima de 140 mmHg (sistólica) ou 90 mmHg (diastólica) são considerados definidores de hipertensão.

Para medidas realizadas em ambiente doméstico (monitorização ambulatorial ou doméstica da pressão arterial) utiliza-se limiares 5 mmHg mais baixos. Por fim, valores intermediários entre esses dois níveis são considerados como pressão elevada, uma nova categoria diagnóstica criada nesta edição do
guideline
da ESC.   

Por mais que pareça um simples jogo de palavras, uma gradação de risco crescente (um
continum
) está embutida nesta classificação. Pessoas com hipertensão tem risco maior de eventos cardiovasculares e, para estas, o tratamento farmacológico está claramente indicado. Por outro lado, pessoas com pressão elevada (mas não o suficiente para o diagnóstico de hipertensão) devem ser consideradas de risco intermediário e a decisão de farmacoterapia deve levar em conta fatores de risco adicionais (ver a seguir).   

Vale destacar que este racional de uma categoria intermediária já estava presentes em outras duas grandes diretrizes do assunto (diretriz internacional de hipertensão de 2020 e da associação americana de cardiologia de 2017), porém com limiares diferentes. Em suma, está uniforme a necessidade de classificar os pacientes em 3 níveis de risco, por mais que haja divergências entre diferentes sociedades sobre os limiares a serem utilizados para as categorias.  

Figura 1.
Categorias de pressão arterial conforme a ESC. Extraído da referência 1. 

Alvos de tratamento
  

Para além das definições e categorias, os alvos de tratamento também mudaram. Nestas novas recomendações orienta-se buscar
alvos de pressão arterial sistólica de 120 a 129 mmHg e diastólica de 70 a 79 mmHg
. Estes alvos simplificam as orientações das diretrizes anteriores e são recomendados para qualquer uma das categorias de diagnóstico propostas (hipertensão ou pressão elevada).   

Assim, uma vez confirmado o diagnóstico de hipertensão (
Figura 1
), recomenda-se tratamento combinado (farmacológico e medidas de estilo de vida) para todas as pessoas. Por outro lado, para pessoas com pressão elevada (categoria intermediária), deve-se individualizar – como apresentado a seguir. Em caso de se atingir bom controle com medidas de estilo de vida, medicamentos podem ser posteriormente reduzidos ou mesmo suspensos (se a pressão estiver bem controlada) em pessoas com hipertensão. Após ser iniciado o tratamento farmacológico, o paciente deve ser reavaliado com frequência (a cada 1-3 meses) com ajustes frequentes até se atingir o alvo de controle.   

A diretriz ainda aponta que: (1) estes alvos precisam ser bem tolerados pelo paciente, do contrário devem ser revisados; (2) alvos mais lenientes podem ser considerados em pessoas com hipotensão ortostática, idade maior que 85 anos ou fragilidade; e (3) estas medidas devem ser idealmente confirmadas fora de consultório. Para os indivíduos que não são candidatos a tais alvos a recomendação é buscar níveis de pressão tão baixa quanto razoavelmente possível - princípio ALARA (
as low as reasonably achievable
).  

Indicações de tratamento nas pessoas com pressão elevada
  

Com a definição de uma nova categoria (pressão elevada), vieram junto recomendações de manejo específicas. Esta categoria deve ser entendida como intermediária, de risco mais elevado de complicações, mas não elevado o suficiente para gerar recomendação de tratamento para todos indivíduos. Assim, estratificação adicional é necessária neste grupo de pacientes: 

  • Pessoas com risco cardiovascular ≥ 10%; OU com condições de alto risco (doença cardiovascular prévia, diabetes, doença renal crônica moderada ou grave, entre outros -
    Figura 2
    ); OU com risco cardiovascular entre 5 e 10% e modificadores de risco (hipertensão ou diabetes gestacional, história familiar de doença cardiovascular prematura, doença auto-imune, doença mental grave): 
  • Instituir medidas de estilo de vida por 3 meses e, após este período, se a pressão arterial estiver ≥ 130/80 mmHg, farmacoterapia deve ser iniciada, para os seguintes grupos: 
  • Pessoas com risco cardiovascular < 10% E sem condições de alto risco ou fatores adicionais: 
  • Instituir medidas de estilo de vida e, se falha após 6-12 meses, considerar uso de farmacoterapia após discussão com o paciente e individualização caso a caso.  

Quanto à ferramenta de estimativa de risco cardiovascular, a diretriz recomenda o uso de uma validada na população europeia (SCORE2), o que não deve ser generalizado diretamente para outras populações - por exemplo, não é validada no Brasil.  

Mensagem final
 

Os autores desta diretriz relatam, no texto introdutório e na comunicação para imprensa, que fizeram esforço para simplificar as orientações de deixá-las de mais fácil compreensão e aplicação, em especial para generalistas. Além disso, uma figura central integrando todas as recomendações foi proposta (
Figura 2
). Destaca-se nela que: 

  • Os critérios para rastreamento, diagnóstico e categorias estão apresentados, bem como critérios para considerar hipertensão secundária e critérios mais lenientes de controle pressórico. 
  •  Todas as pessoas (independente da categoria de pressão arterial) devem realizar avaliação periódica da pressão e medidas de estilo de vida para evitar ou controlar pressão elevada. Por outro lado, apenas uma parte dos pacientes com pressão elevada terão indicação de controle pressórico com medicamentos.  
  • Pacientes com hipertensão deverão receber tratamento farmacológico na grande maioria das vezes. 
  • A recomendação geral de alvo para todos as pessoas recebendo tratamento farmacológico de 120-129/70-79 mmHg, com preferência de seguimento por métodos com aferições de pressão arterial fora do consultório (monitorização ambulatorial ou domiciliar da pressão arterial).   

Figura 2.
Recomendações do
guideline
de hipertensão arterial da ESC 2024. Adaptado de 1.