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Hipotensão postural: quadro clínico e manejo

Hipotensão postural (também conhecida por hipotensão ortostática) é uma situação relativamente comum de disfunção autonômica. Considera-se que a presença de três subtipos que se definem pelo efeito no ortostatismo na pressão arterial: 

  • Hipotensão ortostática clássica
    : redução persistente de pressão arterial (pelo menos 20 mmHg na pressão sistólica ou 10 mmHg na diastólica)
    dentro de 3 minutos
    do ortostatismo.  
    • Um ponto de corte adicional que pode ser considerado é queda de 30 mmHg em pessoas com pressão arterial basal acima de 160 mmHg.  
  • Hipotensão ortostática protraída (ou atrasada)
    : redução persistente de pressão arterial (pelo menos 20 mmHg na pressão sistólica ou 10 mmHg na diastólica)
    após 3 minutos
    do ortostatismo.  
  • Hipotensão ortostática inicial:
    redução transitória da pressão arterial (pelo menos 40 mmHg na pressão sistólica ou 20 mmHg na diastólica)
    dentro de 15 segundos
    do ortostatismo.  

Do ponto de vista fisiológico, quando a pessoa assume a posição ortostática, entre 500 e 1000 mL de sangue que estão dentro do tórax são deslocados para os membros inferiores e para a vasculatura esplâncnica por efeito gravitacional. Esse fenômeno gera redução da pré-carga e assim do débito cardíaco e da pressão arterial.   

Barorreceptores detectam essa alteração e levam aferências ao sistema nervoso central. Em resposta, há ativação do sistema simpático, com aumento da frequência cardíaca, contratilidade miocárdica e do tônus arterial e venoso. Quando uma ou mais partes deste sistema é comprometida, a resposta autonômica normal se perde e hipotensão postural neurogênica pode surgir.   

Por outro lado, pacientes que têm o sistema preservado (e conseguem elevar a frequência cardíaca de forma compensatória) têm causas não neurogênicas para o quadro. Nesta postagem veremos a importância, causas, manifestações e manejo desta situação.  

Magnitude, evolução e prognóstico
 

Hipotensão postural acontece em aproximadamente 5-10% da população, mas esses números aumentam em alguns subgrupos, em especial acima dos 65 anos e pessoas com diabetes (até 50%). Este aumento com a idade é provavelmente multifatorial, envolvendo redução dos mecanismos adaptativos fisiológicos (redução da sensibilidade de barorreceptores) associados com maior prevalência de doenças e uso de medicamentos associados com hipotensão ortostática.   

A evolução do quadro é bastante dependente da doença de base. Por exemplo, é esperado que pessoas com diabetes e doenças neurodegenerativas (
Parkinson
,
demência por corpúsculos de Lewy
e
atrofia de múltiplos sistemas
) tenham piora progressiva do quadro. Além disso, dentro dos subtipos existe bastante heterogeneidade: enquanto os pacientes com o subtipo protraído tendem a evoluir para o quadro clássico em até 50% dos casos ao longo de uma década, pessoas com o subtipo inicial tem uma evolução mais benigna.  

Um aspecto frequentemente negligenciado no quadro é sua associação com maior risco de morte. Estima-se que pessoas com hipotensão postural clássica tenham um risco de morte 50% maior que a população geral. Como esperado, pacientes com o subtipo protraído tem risco intermediário.   

Dentro das doenças de base (por exemplo, Parkinson), pessoas com hipotensão postural têm uma evolução menos favorável do que aquelas sem o quadro. Uma característica curiosa dentro do quadro é que a gravidade da hipotensão não parece ser um marcador prognóstico (ou seja, o risco de morte não é relacionado com o valor da redução da pressão arterial no ortostatismo).  

Quadro clínico
 

Usualmente, o quadro de hipotensão ortostática é de fácil identificação pela presença de sintomas como síncope/pré-síncope, tontura, distúrbios visuais, fraqueza marcadamente desencadeados por mudança postural de sentado ou deitado para em pé. Pode haver perda de consciência, mas ela é menos comum e mais gradual do que outras doenças que causam síncope, como síncope vasovagal. Além disso, invariavelmente, tem que haver melhora dos sintomas ao sentar ou deitar. A relação dos sintomas com medicamentos, atividades físicas, exposição a ambientes quentes ou consumo de álcool deve ser ativamente questionada. Os sintomas podem também ser exacerbados ao levantar após longos períodos sentados (viagens). Pacientes com falência autonômica tem mais sintomas matinais.   

Uma parte central da avaliação é verificar a pressão arterial com o paciente deitado e após em pé, após 3 minutos nesta posição (sem se apoiar). Há recomendações também de fazer uma parte desta avaliação com o paciente sentado. O teste é considerado positivo se alguma das definições de hipotensão ortostática é atingida (vide introdução) ou se há reprodução dos sintomas do paciente em vigência de pressão arterial sistólica menor que 90 mmHg.  

A frequência cardíaca também deve ser avaliada, uma vez que a ausência de aumento (de pelo menos 15 batimentos por minuto) sugere causa neurogênica para o quadro. Uma outra forma de avaliar esta relação é pela variação da frequência cardíaca dividido pela variação da pressão arterial após ortostatismo:  

(frequência cardíaca final - inicial) / (pressão arterial final - inicial) < 0,5 = sugere hipotensão neurogênica  

 Por vezes, o desafio da situação é compreender adequadamente a queixa principal, pois ela pode ser expressa de forma bastante variável, como "tontura", "desequilíbrio", "fadiga", alterações visuais e, até mesmo, dor torácica e dispneia. A história é útil para diferenciar de outras causas de "tontura" (e queixas semelhantes).  

Por exemplo, nos quadros de doença vestibular ou cerebelar, o sintoma é de movimento, rotação e/ou desequilíbrio (cinetose), frequentemente desencadeado por mudança da posição da cabeça (mudar de posição na cama). Em idosos, a única manifestação do quadro pode ser quedas inexplicadas.  

Uma característica frequentemente associada ao quadro é a hipertensão supina, quando o paciente apresenta hipertensão sentado ou deitado, apesar de ficar com hipotensão (ou pressão normal) em pé. Ela é um problema adicional nestes pacientes porque aumenta a complexidade do manejo — é necessário manejar ao mesmo tempo hipertensão e hipotensão.   

Causas de hipotensão ortostática
 

As causas de hipotensão postural estão listadas na
Tabela 1
. Usualmente a primeira preocupação é identificar se há alguma sinucleopatia, das quais doença de Parkinson, demência por corpúsculos de Lewy, atrofia de múltiplos sistemas e falência autonômica pura fazem parte. Excetuando-se a falência autonômica pura, as demais doenças deste grupo se destacam por uma combinação variável de sintomas de parkinsonismo e disfunção cognitiva. Perda de olfato e alucinações também podem fazer parte do quadro.   

Outra causa neurogênica de hipotensão ortostática são as neuropatias autonômicas periféricas, quando há acometimento de fibras finas autonômicas; esta não é uma condição única, mas sim manifestação de diferentes doenças que causa neuropatia, incluindo diabetes (causa mais comum), amiloidose, neuropatias autoimunes, secundárias a infeções e exposição a substâncias.   

Além das causas de hipotensão postural neurogênica (listadas anteriormente), existem causas não neurogênicas. Aqui neste grupo entram efeitos adversos de medicamentos, consumo de álcool e depleção volêmica por mais diferentes causas (diarreia, vômitos, sangramento).   

Tabela 1.
Causas de hipotensão ortostática. Referência 1 e 2. 

Causas neurogênicas

  • doença de Parkinson
  • Demência por corpúsculos de Lewy
  • Atrofia de múltiplos sistemas
  • Falência autonômica pura
  • Neuropatia periférica autonômica

Causas não neurogênicas

  • Consumo de álcool
  • Medicamentos
  • Antianginosos e antiarrítmicos
  • Anticolinérgicos
  • Antidepressivos
  • Anti-hipertensivos
  • Antiparkinsonianos
  • Diuréticos Sedativos
  • Fenotiazidas e outros neurolépticos
  • Depleção de volume
  • Diarreia Vômitos Sangramento Desidratação
  • Disfunção cardíaca, incluindo insuficiência cardíaca, miocardite e doenças valvares
  • Insuficiência adrenal
  • Hipotireoidismo
  • Feocromocitoma

Manejo
 

Um aspecto relevante do manejo é a investigação. Na maioria dos pacientes será possível identificar o quadro pela história e testando a diferença de pressão com ortostatismo. Eletrocardiograma é recomendado naqueles com palpitações ou síncopes, para descartar arritmias. Por outro lado, deve-se evitar imagens do sistema nervoso central, se não houver suspeita de causa específica. Teste de tilt também deve ser usado de forma muito eventual, apenas naqueles pacientes com alta suspeita pela história, mas que não há queda de pressão na avaliação no consultório.  

Quanto ao tratamento, o alvo é controlar os sintomas do paciente — tanto a intensidade quanto a frequência dos episódios. O primeiro passo é limitar a exposição a situações, medicamentos e fatores de agravo. Por exemplo, redução ou suspensão de anti-hipertensivos, suspender consumo de álcool e hidratação devem ser tentados se forem potenciais etiologias ou contribuintes para o quadro. Em pacientes com hipertensão, deve-se buscar alvos menos estritos de controle, por volta de 140 - 150 mmHg de pressão sistólica. Os anti-hipertensivos mais associados com sintomas são de efeito central, alfa e betabloqueadores. Deve-se dar preferência para medicamentos em dose baixa e com meia-vida mais curta.   

Aumento do consumo de líquidos e sal pode ser útil; deve-se buscar consumo de 2-3 L de líquidos ao dia e consumo de 6-10 g de sal. O uso de meias de elásticas e manobras evitativas também podem ser úteis. Manobras evitativas incluem levantar-se lentamente, agachar, realizar contração isométrica nos braços, pernas ou musculatura abdominal. Aumentar a altura da cabeceira da cama também pode ser útil para controle dos sintomas.   

Medicamentos podem ser testados em pacientes que não respondem às medidas anteriores. No Brasil não há disponibilidade de midodrina ou droxidopa, assim a principal opção é fludrocortiona, na dose de 0,05 a 0,2 mg (meio a dois comprimidos), uma vez ao dia. Deve-se estar atento a hipocalemia com o uso. Piridoxina (30-60 mg 3x ao dia) pode ser tentada em pacientes que se mantém sintomáticos; a principal limitação ao seu uso são sintomas gastrintestinais.    

Por fim, alguns pacientes têm um subtipo específico de hipotensão ortostática — a hipotensão pós-prandial. A apresentação é de hipotensão (queda de 20 mmHg ou redução abaixo de 90 mmHg da pressão sistólica) dentro de 2 horas de uma refeição. Para estes pacientes, aumentar a frequência e reduzir o volume das refeições, consumir pelo menos 500 mL de líquido pré-prandial, associar café e limitar consumo de carboidratos simples são as principais medidas. Do ponto de vista farmacológico, acarbose (inibidor da alfa-glicosidase) é a principal opção. 

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