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Cardioversão e desfibrilação: aspectos técnicos e indicações

Desfibrilação e cardioversão elétrica são duas abordagens semelhantes para controle de arritmias cardíacas. Desfibrilação é a realização de um choque elétrico em qualquer momento do ciclo cardíaco. Já cardioversão envolve administrar também um choque, mas que seja sincronizado (junto com) o complexo QRS. Este cuidado visa minimizar o risco de um choque sobre a onda T e, assim. evitando o risco de desencadear fibrilação ventricular no curso do tratamento. Enquanto a desfibrilação se usa primariamente em contexto de parada cardiorrespiratória, taquiarritmia com instabilidade hemodinâmica é a principal situação que se usa a cardioversão.  

Apesar de ser uma terapia bastante estabelecida no dia a dia de atendimento de pacientes com diversas arritmias, trata-se de um campo relativamente novo na cardiologia. O primeiro relato de uso de energia elétrica para resolver uma arritmia é de 1956. Em 1962, desfibriladores começaram a estar disponíveis na prática clínica. Com eles, surgiu a possibilidade de tratar de forma eficaz arritmias graves e fatais.

Isso, junto com outros fatores, catalisou a criação e expansão de unidades de terapia intensiva cardíaca (antes chamadas de unidades de cuidados coronarianos) e a melhora do cuidado para pacientes com doenças cardíacas agudas. Focaremos nesta postagem sobre cardioversão e desfibrilação externa fora do contexto de reanimação cardiorrespiratória.  

Aspectos técnicos
 

Uma questão interessante no tratamento elétrico é que seu mecanismo de ação não é bem compreendido. Hipotetiza-se que dois eventos (complementares e não excludentes) expliquem a capacidade da energia elétrica interromper arritmias.

A primeira hipótese (teoria da massa crítica) é que, com o choque, uma fração grande do miocárdio acaba sendo despolarizanda e, assim, os mecanismos de perpetuação da excitação não podem se manter e então, após o período refratário, o ritmo cardíaco normal se reinicia.

E a segunda hipótese (teoria do limite superior da vulnerabilidade) diz que o choque atinge um nível de energia maior que o limite de vulnerabilidade para fibrilação ventricular, o que permite que uma área suficientemente grande seja despolarizada sem induzir outras áreas a desenvolver novos eventos de reentrada.  

Alguns fatores podem influenciar o sucesso do procedimento de cardioversão ou desfibrilação. Pás ou placas de maior tamanho e na posição antero-posterior parecem ser mais eficazes. Redução da impedância (com uso de gel, por exemplo) também aumenta a eficácia.  

Maior pressão e maior distância entre as pás também auxilia na eficácia. Por outro lado, obesidade, tempo prolongado entre choques e estatura mais elevada pioram a eficácia do tratamento.  

Principais indicações
 

Cardioversão pode ser usada para o tratamento de diversas taquiarritmias cardíacas como veremos a seguir. A taxa de sucesso (reversão para ritmo sinusal) para algumas situações se aproxima de 100%. Já a desfibrilação, é reservada para o tratamento de taquicardia ou fibrilação ventricular no contexto de parada cardiorrespiratória.

Como regra geral, arritmias com instabilidade hemodinâmica tem indicação de terapia elétrica.
Define-se instabilidade como a presença de sinais ou sintomas de gravidade que indiquem que arritmia está impedindo a perfusão adequada de tecidos
, como choque e hipotensão, dor torácica, redução do nível de consciência, dispneia.  

Fibrilação atrial
é a arritmia mais frequentemente tratada com cardioversão elétrica. O uso de ondas bifásicas aumenta a eficácia do tratamento elétrico (para fibrilação atrial e para todas as outras indicações) e atinge o controle de ritmo com menos energia. Como regra geral, utiliza-se esse tratamento naqueles pacientes com sintomas persistentes, incapacidade de controle da frequência cardíaca ou pacientes com início do quadro há menos de 12 meses e que tenham alto risco cardiovascular.   

Um cuidado para cardioversão em fibrilação atrial é minimizar o risco de eventos embólicos relacionados ao tratamento. Para isso, recomenda-se uso de anticoagulação por 3-4 semanas antes e após o procedimento. Naqueles pacientes com fibrilação atrial com menos de 48 horas de duração ou com ecocardiograma transesofágico descartando a presença de trombos intracardíacos, pode-se abrir mão da anticoagulação pré-cardioversão. Ainda assim, a anticoagulação após o procedimento deve ser mantida por pelo menos 4 semanas. Você pode encontrar mais detalhes sobre as indicações e cuidados com esse tratamento
nesta nossa postagem
.

Deve-se lembrar que o tratamento da fibrilação atrial envolve também controle da frequência cardíaca e do risco tromboembólico.
Você pode conferir mais sobre estes assuntos aqui
.  

Outra indicação bastante comum de cardioversão é o
flutter atrial
. Trata-se da arritmia com maior taxa de sucesso ao tratamento elétrico, em especial nos pacientes com flutter tipo I (um só ciclo de reentrada presente). Em função destas características, é comum se utilizar energias menores (50 joules, bifásico) para reversão deste ritmo.    

Assim como em outras arritmias, existem diferentes mecanismos eletrofisiológicos na
taquicardia supraventricular
como reentrada atrioventricular nodal ou arritmia atrial. Tratam-se de mecanismos sensíveis a manobras vagais ou adenosina endovenosa. Entretanto, para casos persistentes, pode ser necessário cardioversão. Quando isso ocorre, é provável que a localização seja mais profunda e que necessite energia mais alta.   

Além dessas, a
taquicardia ventricular
pode ser tratada tanto com desfibrilação quanto com cardioversão. Utiliza-se a segunda opção quando o paciente não está em parada cardiorrespiratória (ou seja, o paciente tem pulso palpável e ventilação eficaz) e tem complexo QRS e onda T organizados e é monomórfica.

Apesar de ser sensível a choques de menor energia, tende-se a preferir choques iniciais de pelo menos 100 joules, para evitar choques repetidos e atrasos na reversão deste quadro que pode deteriorar para situações ainda mais graves. Mesmo em pacientes com pulso, se a frequência da taquicardia ventricular é muito elevada, se complexos QRS não são bem identificados, são alargados, de morfologia atípica ou polimórfica, deve-se preferir desfibrilação (não sincronizada) com 200 joules bifásico.  

Na
fibrilação ventricular
é esperado que o paciente tenha sinais francos de instabilidade hemodinâmica e esteja na iminência ou já em parada cardiorrespiratória (ausência de pulso e respiração ausente ou ineficaz). Assim, opta-se sempre pelo tratamento com desfibrilação (choque não sincronizado com o QRS) — que pode ter eficácia tão elevada quanto 95% se aplicada precocemente, antes da deterioração do quadro. Assim, o recomendado é choque assim que possível com 200 joules bifásico.   

Por fim, em parada cardiorrespiratória com fibrilação ou taquicardia ventricular, utiliza-se desfibrilação com 200 joules bifásico (com opção de aumentar nível de energia se falha).  

Considerações adicionais
 

Alguns aspectos práticos da realização do procedimento de cardioversão elétrica são importantes para melhores resultados, maior segurança e maior conforto do paciente. A primeira questão é realizar o procedimento em ambiente adequado, com disponibilidade de materiais para monitorização do paciente, acesso venoso periférico seguro, disponibilidade de oxigênio suplementar e equipamento para reanimação cardiorrespiratória. Além disso, o paciente deve ser sedado para evitar os desconfortos da descarga elétrica.   

Ao selecionar o botão de sincronização (para cardioversão), deve-se estar atento a alguns aspectos práticos. O primeiro é que nestas situações o choque não é realizado de forma imediata, mas sim apenas quando o complexo QRS é identificado; assim, os botões para acionar o choque (usualmente nas pás) devem ser mantidos acionados até que o choque seja realizado. Além disso, antes de administrar o choque o profissional deve conferir que o equipamento está marcando o QRS adequadamente para sincronizar o choque.

Dependendo da amplitude e derivação selecionado, pode haver falha na marcação e risco de choque sobre onda T e consequente risco de induzir fibrilação ventricular. Se a marcação não estiver sobre o QRS, deve-se ajustar amplitude e derivação para evitar erros. Por fim, se for necessário um segundo choque sincronizado, deve-se lembrar de reacionar o botão de sincronização, uma vez que ele acaba sendo desarmado após o primeiro choque (volta para o modo desfibrilação - não sicronizada).  

Além dessas questões práticas, algumas situações merecem comentários adicionais: 

  • Em pacientes que possuem marca-passo ou desfibrilador interno implantado, são necessários alguns cuidados antes do procedimento. O principal risco é danificar o gerador, portanto deve-se colocar a placa ou pá para administração do choque pelo menos 12 cm de distância do gerador e dar preferência para a posição anterio-posterior. Também deve-se usar o menor nível de energia eficaz. Após o procedimento, o marca-passo ou desfibrilador implantável devem ser interrogados para confirmar que o funcionamento não foi alterado. 
  • Desfibrilação e cardioversão podem ser realizadas na gravidez sem afetar o ritmo cardíaco do feto. Deve-se apenas realizar monitorização de batimentos cardíacos fetais durante o procedimento.  
  • Intoxicação digitálica é uma das únicas contraindicações relativas à cardioversão, em especial se houver hipocalemia associadas. Isso se deve ao risco de induzir taquicardias ventriculares nesta situação. Assim, em arritmias supraventriculares deve-se postergar o procedimento até normalização do nível sérico de digoxina. Por outro lado, em arritmias ventriculares, deve-se realizar lidocaína profilática, antes da administração do choque.

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