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Proteinúria: definições e abordagem diagnóstica

Definições
 

Conceitualmente, proteinúria é a excreção aumentada de proteínas na urina. Pessoas hígidas excretam na urina até 150 mg/dia de proteínas (sendo deste quantitativo 20 mg albumina). Portanto, define-se proteinúria pela presença de mais de 150 mg/dia de proteína na urina. Valores entre 150 e 500 mg/dia são considerados moderados e, acima disso, graves.   

Perda urinária acima de 3,5 g/dia de proteínas indica proteinúria nefrótica, que tem significado clínico e abordagem específica. Quanto a albumina, perdas entre 30 e 300 mg ao dia são consideradas moderadas (antigamente, microalbuminúria) e acima de 300 mg ao dia são consideradas graves (antigamente, macroalbuminúria).   

Quanto a magnitude, sabe-se que entre 10 e 20% da população apresenta proteinúria, com aumento da prevalência com a idade e com doenças como hipertensão sistêmica de diabetes
mellitus
. Além disso, proteinúria é sabidamente marcador independente de perda de função renal, eventos cardiovasculares e morte. Essa relação é tão bem documentada que há aumento progressivo de risco cardiovascular com aumento da albuminúria, mesmo valores considerados dentro do normal (abaixo de 20-30 mg de albumina ao dia). 

Adicionalmente, do ponto de vista de mecanismo, existem três tipos principais de proteinúria. A proteinúria glomerular é aquela que ocorre em função do aumento da permeabilidade do glomérulo, tipicamente identificada pelo aumento de albumina na urina. A proteinúria tubular, ocorre por incapacidade dos túbulos renais em reabsorver proteínas normalmente filtradas (como beta-2-microglobulina e cadeias leves das imunoglobulinas). A proteinúria por transbordamento é relacionada a aumento sistêmico de proteínas de baixo peso molecular (como cadeias leves nas paraproteinemias e mioglobina na rabdomiólise).  

Veremos neste artigo as causas e como avaliar pacientes com proteinúria subnefrótica.  

Exames para investigação
 

O exame de urina mais disponível é a fita de urina. Nela, um dos reagentes é o azul de tetrabromofenol, que reage com a albumina e muda de cor dependendo da quantidade de albumina. Trata-se de um exame semi-quantitativo e menos sensível para medidas menores de albuminúria.   

Além disso, urinas muito diluídas são causa de falso negativo. Falsos positivos podem ocorrer por uso de contraste iodado, alcalinidade urinária, hematúria franca e alguns antissépticos. Uma questão especialmente relevante é que se trata de um método para detecção de albumina, logo proteinúrias não-glomerulares (não dependentes de albumina) usualmente não são identificadas com este método.  

Pacientes com suspeita de doença renal aguda ou crônica ou com achado ocasional de alteração na fita de urina devem realizar um exame quantitativo. O exame preferencial é a coleta de amostra de urina para dosagem de albuminúria (ou proteinúria) e creatininúria e cálculo da relação dos dois é um exame quantitativo.   

O resultado desta divisão (proteinúria ou albuminúria dividida pela creatininúria) representa a excreção diária de proteínas na urina. A estimativa tem ótima relação com a dosagem em de urina de 24 horas, mas é mais confortável e menos sujeito a erros de coleta.   

Em pessoas com diabetes dá-se preferência aos exames de albuminúria, uma vez que é a principal proteína excretada na doença renal do diabetes. A acurácia do método é influenciada pela excreção de creatinina; assim, pessoas com maior creatininúria (maior massa muscular) tem a tendência de ter uma relação menor e, portanto, resultados subestimados. Já com idosos e pessoas desnutridas ocorre o inverso (menor excreção de creatinina e superestimativa da proteinúria).   

A coleta de urina de 24 horas é considerada o padrão ouro para avaliação e quantificação de proteinúria. Seu principal problema é a coleta completa - tanto coletas insuficientes e excessivas são comuns. Uma forma de verificar isso é realizar dosagem de creatininúria associada; homens tem excreção 20-25 mg/kg e mulheres 15-20 mg/kg em 24 horas (considerando sempre o peso de massa magra).   

Por fim, na suspeita de dano renal por paraproteinemia (transbordamento relaciona a mieloma, amiloidose, entre outros -
Tabela 1
), pode ser necessário fazer pesquisa específica de eletroforese e imunofixação de proteínas urinárias, bem como pesquisa direta de cadeias leves. O exame do ácido sulfossalicílico pode ser uma abordagem semi-quatitativa (da mesma forma que a fita de urina faz com a albuminúria), mas sua disponibilidade é variável.   

Abordagem diagnóstica
 

O primeiro passo na avaliação de um paciente com proteinúria é a sua quantificação, uma vez que a maioria das proteinúria benignas são menores que 1-2 g/dia, a quantidade de proteinúria é relevante tanto para fins prognósticos (quanto maior a proteinúria, maior o risco de evolução para perda de função renal) quanto para controle de tratamento.   

Como vimos na sessão anterior, a preferência se dá por exame de amostra de urina e dosagem da proteinúria e creatininúria. Alguns autores sugerem que se realize uma primeira coleta de urina de 24 horas para comparar com o exame de amostra e que se repita a coleta em situações de mudança de tratamento.   

Uma vez que a proteinúria tenha sido identificada e confirmada, deve-se realizar entrevista e exame físico em busca da causa. A
Tabela 1
resume as principais etiologias de proteinúria por mecanismo. Diabetes, neoplasias, doenças autoimunes prévias (em especial reumatológicas), são etiologias mais comuns. O sedimento urinário também é útil para avaliação e é parte da avaliação adicional. Ele ajuda para indicar outros sinais de dano glomerular como hematúria e hemácias dismórficas, leucocitúrias e cilindros.  

A creatinina sérica deve ser medida para estimar a taxa de filtração glomerular. Pacientes com sedimento urinário brando, sem perda de função renal e que a avaliação inicial não sugere a etiologia, deve-se avaliar a possibilidade de proteinúria transitória e proteinúria ortostática. Em casos que seguem sem definição diagnóstica, frequentemente deverá se considerar encaminhamento para nefrologista e, em alguns casos, biópsia renal. A
Figura 1
resume essa abordagem.  

Tabela 1.
Principais causas de proteinúria, divididas pelo tipo de acometimento renal. A partir da referência 1 e 4. 

Glomerular

  • Doença renal do diabetes - causa mais comum 
  • Induzida por drogas (AINEs, lítio, metais pesados, heroína) 
  • Linfoma 
  • Infeções virais (HIV, HCV, HBV) 
  • Glomerulonefrites primárias 
  • Secundário a doenças do tecido conjuntivo.

Tubular

  • Nefroesclerose hipertensiva
  • Tubulopatia por AINEs
  • Nefrite interstitial alérgica
  • Nefrite aguda por hipersensibilidade
  • Doença falciforme
  • Doença policística renal

Transbordamento

  • Mieloma múltiplo
  • Amiloidose
  • Mioglobinúria
  • Linfoma (se houver produção de imunoglobulinas associada)

Figura 1.
Abordagem diagnóstica da proteinúria. Adaptado da referência 3. 

Proteinúria transitória é uma situação relativamente comum, especialmente em adultos jovens. Estudos populacionais sugerem que ocorre em até 5% de universitários. Já a proteinúria ortostática é uma situação peculiar de excreção aumentada de proteinúria que ocorre apenas em ortostatismo. Seu diagnóstico também é mais comum em adultos jovens (mas é menos frequente que proteinúria transitória. É identificada coletando-se um exame de urina de 24 horas, mas coletando as amostras noturnas (em que o paciente está em decúbito) em um frasco separado (incluindo a primeira da manhã seguinte).  

Por fim, um desafio peculiar na avaliação da proteinúria é a avaliar de pacientes com diabetes. Apesar desta ser causa frequente de dano glomerular e a maioria dos pacientes dispensar de investigações invasivas, uma fração das pessoas com diabetes terão outras causas de proteinúria e podem ter indicação de biópsia renal.
Você pode ler mais sobre esta situação nesta nossa postagem

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