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Bronquiolite: etiologia, sintomas e abordagens terapêuticas

A bronquiolite é uma das principais infecções respiratórias em menores de 2 anos e a principal causa de internação de lactentes com menos de 3 meses no mundo.  

O maior causador de bronquiolite em crianças é o vírus sincicial respiratório (VSR). Estimativas sugerem que cerca de 34 milhões de novos casos de infecção respiratória inferior devido ao VSR ocorrem globalmente em crianças menores de 5 anos, gerando 3,4 milhões de internações em hospitais e cerca de 199.000 mortes por ano, predominantemente no mundo em desenvolvimento.   

A definição da bronquiolite em crianças é controversa entres as academias europeia e americana. Os guidelines europeus definem bronquiolite como presença de esforço respiratório em menores de 1 ano. Já os americanos, a definem como primeiro evento de sibilância no menor de 2 anos precedido de sintomas de coriza e espirros, sendo essa a classificação a mais utilizada.   

Etiologia  

 O vírus sincicial respiratório (VSR), que infecta cerca de 95% dos lactentes menores de 2 anos, pode ser responsável por até 75% das bronquiolites e 40% das pneumonias durante os períodos de sazonalidade. Outros agentes da bronquiolite incluem o rinovírus, vírus parainfluenza, adenovírus, bocavírus, metapneumovírus e coronavírus. 

É comum a coinfecção com mais de um vírus, que é encontrada em cerca de 30% dos casos de crianças hospitalizadas. Algumas evidências sugerem que a coinfecção na bronquiolite, particularmente VSR em combinação com rinovírus ou metapneumovírus, pode estar associada à evolução mais grave da doença em comparação com a infecção por um único vírus.  

Os fatores de risco para bronquiolite grave ou complicada incluem: 

  • Prematuridade (idade gestacional ≤36 semanas); 
  • Baixo peso ao nascer; 
  • Idade <12 semanas; 
  • Doença pulmonar crônica, particularmente displasia broncopulmonar; 
  • Imunodeficiência; 
  • Defeitos anatômicos das vias aéreas (por exemplo, laringomalácia, fístula traqueoesofágica); 
  • Doença cardíaca congênita hemodinamicamente significativa; 
  • Doença neurológica. 

Idade menor que 6 meses, ausência de aleitamento materno, domicílio lotado, frequência de creche, nascimento aproximadamente dois meses antes ou depois do início da época de sazonalidade dos vírus, gemelaridade, irmãos mais velhos que frequentam escola e altitude elevada (>2.500 metros) também são fatores de risco ambientais.  

Além disso, o contato com poluentes do ar, como o ozônio e os poluentes do trânsito, tem sido associado à exacerbação de infecções respiratórias em crianças menores de 5 anos. A exposição ao tabaco durante a gestação e após o nascimento também é associada ao aumento do risco de admissão hospitalar e gravidade da doença.  

Manifestações clínicas 
 

A apresentação clínica clássica da bronquiolite começa com sintomas de infecção viral do trato respiratório superior, como secreção nasal e coriza por 2 a 4 dias, além da febre, que pode estar ausente em até 50% dos casos. As manifestações de trato respiratório inferior surgem em cerca de 7 dias, manifestando-se com tosse persistente, taquipneia e aumento do trabalho respiratório, visualizado por retrações intercostais ou supraclaviculares, uso de músculos abdominais, grunhidos ou batimento de asa nasal.  

O tempo de progressão dos sintomas pode variar, e os bebês pequenos podem apresentar apneia. Os achados em ausculta incluem estertores subcrepitantes e sibilos. Uma das marcas da bronquiolite é a variação minuto a minuto de achados na clínica. À medida que o muco e os detritos nas vias aéreas são eliminados tossindo, o estado da criança muda do sono para agitação.  

Diagnósticos diferenciais 

A ausência de sintomas respiratórios superiores deve levantar suspeitas de outras causas de dificuldade respiratória em bebês, incluindo doenças cardíacas, congênitas e anormalidades das vias aéreas, como anel vascular ou aspiração de corpo estranho.   

Outras infecções podem assemelhar-se ou complicar a bronquiolite. A coqueluche deve ser considerada em lactentes com tosse grave ou paroxística, ou com exposição conhecida. Infecções bacterianas complicando bronquiolites, incluindo otite média ou pneumonia, podem se apresentar como uma nova febre ou piora do estado mais tarde no curso da doença.  

Abordagens terapêuticas 

Não existe uma medicação específica utilizada para bronquiolite, o tratamento é basicamente baseado em hidratação e suporte respiratório.  

Os guidelines dos Estados Unidos recomendam o uso de oxigênio quando a saturação fica abaixo de 90%, ao passo que no Reino Unido o limite é 92%. O oxigênio pode ser administrado através de vários dispositivos de distribuição e algumas crianças com doença grave podem necessitar de ventilação com pressão positiva. A cânula nasal de alto fluxo é um modo não invasivo de fornecimento de oxigênio capaz de fornecer alguma pressão expiratória final positiva, particularmente em crianças pequenas. Há estudos que demonstram a evidência do cateter nasal de alto fluxo em evitar a intubação em algumas crianças, bem como de reduzir a duração do uso de oxigênio suplementar, mas eles devem ser complementados, pois alguns apresentam resultados mistos. 

Algumas crianças também podem necessitar de apoio com hidratação suplementar. O líquido pode ser administrado por via intravenosa ou enteral, via sonda nasogástrica, com preferência dada a este último, devido a uma associação entre melhores resultados e fornecimento contínuo de nutrição enteral. Se forem administrados fluidos intravenosos, deve-se ter cuidado e preferir soluções isotônicas devido ao risco de hiponatremia. 

Aspiração frequente de nariz e secreções orais muitas vezes proporcionam alívio do sofrimento e melhoram o trabalho de respiração e capacidade de alimentação, mas a aspiração deve ser limitada às narinas ou orofaringe, pois a aspiração traqueal profunda não fornece benefício adicional.  

Farmacoterapia  

 Embora os sibilos possam estar presentes, a causa do broncoespasmo parecer estar relacionada à presença de debris no bronquíolo, não necessariamente de constrição da musculatura lisa. Segundo os consensos, não há benefícios sobre os tempos de internação, melhora clínica e prova de função pulmonar, quando comparados à nebulização com placebo, realizada com beta-2 adrenérgicos (salbutamol, fenoterol), sendo dispensável seu uso.   

O uso de beta-2 adrenérgicos pode causar efeitos adversos como taquicardia e tremores, além de gerar custos. As revisões Cochrane não conseguiram demonstrar qualquer impacto nos resultados clínicos com o uso de salbutamol ou corticosteróides em bronquiolite. Nenhum deles é atualmente recomendado para manejo. A resposta aos broncodilatadores é improvável e imprevisível em crianças com menos de 1 ano e não existe um método válido para avaliar a resposta no ambiente clínico.  

Contudo, pacientes com história de atopia familiar ou pessoal podem talvez responderem ao broncodilatador quando o rinovírus (RV) for o agente etiológico da bronquiolite. Esse dado, porém, não deve generalizar essa conduta, visto que em cerca 80% dos eventos há infecção pelo VSR, além de outros 5 % incluírem a soma de prevalência de outros vírus menos prevalentes.  

Há um debate sobre o uso de solução salina hipertônica em crianças com bronquiolite, embora a maioria dos estudos e meta-análises não tenham conseguido demonstrar benefício.  

Não foi encontrado que a epinefrina melhore o tempo de internação ou o quadro clínico entre pacientes internados com bronquiolite, embora haja algumas evidências que sugerem que pode reduzir o risco de hospitalização quando usado em ambiente ambulatorial.  

Ribavirina, o único antiviral atualmente disponível não é recomendado devido às dificuldades de seu uso, alto custo e risco para os cuidadores.  

O uso de antibiótico não tem evidências qualificadas em casos de bronquiolite de etiologia essencialmente viral. Isso também vale para prescrição de macrolídeos para a tosse, que pode persistir por até 3 semanas após a bronquiolite. Embora haja estudos indiquem que a azitromicina poderia prevenir a sibilância recorrente por rinovírus, não se apoia rotineiramente seu uso.  

Profilaxia 

Em 2013, o Ministério da Saúde do Brasil passou a disponibilizar o palivizumabe, em todo o território nacional, para bebês de acordo com os seguintes critérios:  

  • Prematuros até 28 semanas e 6 dias de idade gestacional, menores de um ano de idade; 
  • Crianças portadoras de cardiopatia congênita com repercussão hemodinâmica demonstrada até o segundo ano de vida; 
  • Crianças portadoras de doença pulmonar crônica da prematuridade, independente da idade gestacional, até o segundo ano de vida.  

O medicamente está disponível para crianças pertencentes a esses grupos, hospitalizadas ou não.  

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) preconiza a profilaxia para, além dos grupos contemplados pelo Ministério da Saúde, estendendo a recomendação para bebês prematuros nascidos entre 29 e 31 semanas e 6 dias de idade gestacional, baseado em diversas evidências que demonstram que este é também um grupo vulnerável para desenvolver formas graves da infecção, especialmente nos primeiros 6 meses de vida.  

O palivizumabe é um anticorpo monoclonal, IgG1 humanizado, direcionado para um epítopo no sítio antigênico A da proteína de fusão do VSR. É composto de 95% de sequências de aminoácidos humanos e 5% de murinos. Ele apresenta atividade neutralizante e inibitória da fusão do VSR no epitélio respiratório da criança e demonstrou eficácia na redução da gravidade dos quadros de bronquiolite nesses pacientes. 

O palivizumabe deve ser administrado na posologia de 15 mg/kg, via intramuscular (IM), de preferência na face anterolateral da coxa, uma vez por mês, durante o período de sazonalidade do VSR previsto na comunidade. A primeira dose deve ser administrada um mês antes do início da estação do vírus e as demais aplicações subsequentes devem ser administradas durante este período, até o máximo de cinco doses.  

Entre os novos anticorpos monoclonais que estavam em desenvolvimento clínico, o primeiro que se tonou disponível para uso em diversos países, já em 2023, foi o nirsevimabe. Trata-se de um novo anticorpo monoclonal humano, recombinante, neutralizante de imunoglobulina G1 kappa, direcionado à conformação de pré-fusão da proteína de fusão (F) do VSR. Essencialmente, ele se liga à proteína F para prevenir a entrada do vírus nas células. O nirsevimabe também tem uma substituição de três aminoácidos, resultando em meia-vida estendida, prolongando, portanto, a duração de sua ação protetora.  

Levando em conta os benefícios demonstrados de forma consistente nos estudos e antecipando o grande impacto que esta intervenção tem o potencial de promover na saúde dos lactentes e crianças, a SBP e a SBIm recomendam o uso do nirsevimabe (Beyfortus©), em dose única, para todos os recém-nascidos e lactentes menores de um ano, nascidos durante ou entrando em sua primeira temporada de circulação do VSR.  

A dose recomendada é de 50mg para crianças com peso inferior a 5Kg e 100mg para aquelas com peso de 5Kg ou mais. A aplicação deve ser realizada próxima ou durante a estação de maior circulação do VSR em cada região.  

Crianças com até 24 meses de idade, que permanecem vulneráveis à doença grave causada pelo VSR até sua segunda temporada, incluindo, mas não se limitando a aquelas com: doença pulmonar crônica da prematuridade (DPCP); doença cardíaca congênita com repercussão hemodinâmica; fibrose cística; doenças neuromusculares; anomalias congênitas das vias aéreas; imunocomprometimento; Síndrome de Down, devem receber profilaxia com nirsevimabe, na dose de 200mg, até a segunda temporada do VSR. 

Apesar da aprovação, a medicação ainda não está amplamente disponível, o que esperamos que poderá acontecer nos próximos anos.   

Os familiares devem ser orientados sobre a importância da profilaxia, principalmente durante a sazonalidade, incentivando a lavagem das mãos, uso de álcool gel, evitar ambientes fechados e aglomerados, além de exposição a pessoas com quadros respiratórios. Os bebês também não devem ser expostos a tabaco e o incentivo ao aleitamento materno deve ser reforçado.

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