Depois da publicação das primeiras análises do Projeto Genoma Humano, em 2001, as mais diferentes áreas da saúde passaram a se beneficiar das possibilidades do sequenciamento de genes. Um dos destaques trazidos pela pesquisa era a maneira como um organismo atua enquanto responde a variadas condições ambientais e quais o impacto na genética.

Com isso, descobriu-se que cerca de 2% do genoma codifica instruções para a síntese de proteínas – substâncias responsáveis pelo funcionamento do metabolismo. A partir dali o impacto da alimentação sobre a expressão dos genes passou a ser explorado pela genômica nutricional.

Com o sequenciamento genético a expectativa era encontrar a cura imediata para diversas doenças. No entanto, descobriu-se que cada indivíduo possui em torno 200 mil poliformismos. Diante de tantas variações, permanecem as dificuldades em determinar um único causador para inúmeras patologias.

Assim, mais assertiva do que a cura costuma ser a prevenção. Com as informações genéticas e dos hábitos dos indivíduos, hoje é possível observar a predisposição genética para problemas como colesterol alto, diabetes e obesidade e então direcionar de maneira mais efetiva a indicação nutricional.

“É importante que a comunidade cientifica e a área da saúde mude o olhar e passe a investir em prevenção. Estima-se que 30% das mortes por câncer no mundo poderiam ser prevenidas pela alimentação”, afirma Thomas Prates Ong, professor associado do Departamento de Alimentos e Nutrição da Faculdade Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ele, todas as doenças crônicas não transmissíveis podem ser prevenidas.

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Para entender

A genômica nutricional pode ser explorada em três níveis:

Nutrigenética

A área estuda os polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs), considerados variações normais no DNA. As transmutações genéticas são responsáveis pelas diferenças observadas na cor dos olhos e cabelos e no tipo sanguíneo, por exemplo. No entanto, esses poliformismos podem ter influência sobre o risco de desenvolvimento de determinadas doenças, muitas delas associadas ao padrão alimentar.

O parecer do Projeto Genoma Humano destaca alguns SNPs relacionados à nutrição. É o caso do C677T no gene que codifica a enzima metilenotetra-hidrofolato redutase (MTHFR). Ele interfere no status de folato e de homocisteína, tem prevalência no risco cardiovascular e em defeitos do tubo neural, entre outras doenças.

Nutrigenômica

Dedica-se aos estudos sobre o impacto dos nutrientes na expressão gênica. Indivíduos com sobrepeso e obesidade têm demonstrado que, quando modificam seus padrões de alimentação, os genes envolvidos apresentam redução de expressão (down regulation).

“Por outro lado, dependendo da sequência genética, isso vai afetar não só o metabolismo, mas também a forma como o indivíduo responde à alimentação. São direções complementares que precisam ser estudadas”, destaca Ong.

Epigenética

Ocupa-se das alterações herdáveis, que não promovem variações na sequência do DNA, mas que impactam no controle da expressão gênica. Fatores ligados à alimentação podem agir por meios epigenéticos ao longo da vida e se estender por gerações.

A pesquisa do genoma cita como exemplo indivíduos que foram expostos à privação alimentar intrauterina durante o Inverno Holandês da Fome (durante a Segunda Guerra, entre 1944 e 1945) e que na vida adulta apresentaram maior incidência de doenças crônicas.

A expectativa é de que, no futuro, a ampliação do conhecimento sobre o sequenciamento genético possibilite a personalização das indicações nutricionais. “Ainda é preciso não apenas conhecer o genoma completo, mas produzir estudos clínicos e algoritmos sofisticados para mensurar a resposta nas pessoas”, comenta o professor da USP.

Atualmente, uma das maiores dificuldades na nutrição é contar com a aderência do paciente ao plano alimentar. Thomas Ong acredita que a nutrição genômica seja capaz reverter esse quadro quando o paciente estiver ciente da influência genética sobre os alimentos e a sua saúde.

Quanto à qualificação dos profissionais na área da genômica nutricional, ainda são necessários avanços. “É preciso que os cursos ofereçam essa disciplina, pois hoje são poucos que abordam a especialidade”, diz Ong. Segundo ele, é necessário ainda que o nutricionista coloque em prática o olhar multidisciplinar e considere os hábitos alimentares como reflexo dos componentes culturais e do contexto social de cada paciente.

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