Separação conjugal: como trabalhar na terapia cognitivo comportamental?
Afinal, qual é o objetivo da terapia de casal, salvar casamentos? Essa é uma das primeiras e principais perguntas feitas por grande parte dos estudantes e profissionais que desejam iniciar seus trabalhos psicoterápicos com casais.
Não existe uma unanimidade para responder a essa pergunta. Sendo assim, a terapia de casal pode ter dois objetivos. Um é aumentar a satisfação e/ou o ajustamento conjugal. Um segundo objetivo é auxiliar os casais no processo de separação e/ou divórcio, porém não há evidências cientificas robustas para esse último, sendo uma avalição puramente clínica.
Independente do objetivo da terapia de casal, é fato que
a separação conjugal é um fenômeno social que chega na porta de todos os consultórios
, pois segundo dados do levantamento estatístico do IBGE de 2022, foram concedidos algo em torno de 340.000 divórcios no Brasil naquele ano.
A terapia cognitivo-comportamental com casais
Assim como na terapia individual, o tratamento de casais em conflito pela abordagem cognitivo-comportamental enfatiza que os pensamentos e crenças de ambos os conjugues estão no núcleo dos problemas conjugais. É a forma equivocada de interpretar os eventos cotidianos que leva as desavenças e ao afastamento no relacionamento.
Cada parceiro tem uma série de pensamentos automáticos carregados de distorções cognitivas como, por exemplo, o marido achar que sua esposa o está traindo por ela ter chegado mais tarde do que o horário habitual, fazendo assim uma inferência arbitraria.
A forma como os cônjuges atribuem a causa e a responsabilidade pelos desentendimentos está diretamente relacionado com o nível de satisfação conjugal. Quanto mais um parceiro responsabiliza e culpa o outro como o único causador de todos os problemas do casamento, mais insatisfeitos e distantes eles ficam entre si.
As expectativas que os parceiros têm sobre si e seu relacionamento afetam o seu desejo de permanecerem ou não no casamento. Baixos níveis de expetativas estão relacionados a maiores números de desfechos contrários a permanência na união conjugal. As crenças sobre o parceiro e sobre o relacionamento formam um conjunto de ideias que tem um forte impacto na vida conjugal. Por exemplo, quando os cônjuges acreditam que seu parceiro tem que ser perfeito e a sua relação amorosa tem que ser livre de qualquer tipo de conflito, observa-se grande níveis de frustração e afastamento.
Comunicação
Vale a pena dar um destaque a esse tópico, uma vez que essa é a principal queixa dos casais quando chegam aos consultórios de Psicologia. Os cônjuges procuram a terapia na busca de um mediador para que eles possam se entender e conversar sem tantos conflitos. De uma forma em geral, os parceiros reclamam que não estão mais conseguindo conversar, dizendo que discutem o tempo todo, muitas vezes com xingamentos e agressões mútuas.
Qual é o papel do terapeuta na separação conjugal?
A separação conjugal é um dos momentos mais dolorosos na vida de qualquer casal. O nível de estresse é elevado, podendo levar a quadros de ansiedade e depressão. Os cônjuges passam a maior parte do tempo culpando um ao outro pelos problemas no relacionamento. Não esperam qualquer mudança do parceiro e nem acreditam que a relação possa melhor. Os parceiros já não se entendem mais, sua comunicação é pesada, cheia de palavras amargas que muitas vezes são utilizadas para ferir um ao outro. Tudo o que eles querem é se afastar e sair o quanto antes daquele relacionamento.
Mas porque alguém buscaria a terapia de casal, já que desejam se separar?! Não seria mais fácil resolver isso entre eles? Não existe uma resposta fácil para essa pergunta até porque muitas vezes nem mesmo o casal sabe exatamente o que deseja. Muitas pessoas procuram a terapia para melhorarem os seus relacionamentos, mas ao longo do processo vão se dando conta de que não tem mais jeito, que o amor não é mais o mesmo, que seu parceiro não vai mudar e que sua relação não tem mais futuro.
O terapeuta cognitivo-comportamental tem o papel de mediar os casais nesse processo de separação conjugal. Momento muito doloroso que vai exigir do profissional muito tato e sensibilidade para que os parceiros possam fazer esse desenlace conjugal da forma menos sofrida possível. Não é hora para achar culpados ou discussões. É hora de focar no mais importante, a integridade física e mental de ambos os envolvidos.
E quando o casal tem filhos?
A presença de crianças e adolescentes na vida do casal torna a separação conjugal mais delicada. Todo o cuidado deve ser tomado para preservar os laços parentais após o desenlace matrimonial. É importante que os filhos saibam que continuam sendo amados e respeitados por ambos os pais, apesar dos mesmos não ficarem mais juntos. Deve ficar claro que pai e mãe são para sempre, pois a conjugalidade termina, mas a parentalidade não (Wallerstein, & Kelly, 1998).
Dentro dessa perspectiva, o terapeuta cognitivo-comportamental pode auxiliar os casais a definirem como será a convivência com os filhos, a modalidade de guarda, o estabelecimento pensão e outros temas relevantes.
Conclusão
O trabalho com casais em conflito exige muita sensibilidade do terapeuta, especialmente em casos de separação conjugal. O profissional vai precisar de muito tato e time para utilizar as intervenções. Quando o casal tem filhos, o cuidado é redobrado uma vez que a manutenção dos vínculos parentais é fundamental para crianças e adolescente.
Por fim, é importante ressaltar que o papel do psicólogo é mediar o processo de dissolução do casamento, sem nunca tomar partido de um dos parceiros ou mesmo dizer que eles devem se separar. Essa é uma decisão única e exclusiva do casal.
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Separação conjugal: como trabalhar na terapia cognitivo comportamental?
Blog da Artmed, Artmed.
Autores
- Raphael Fischer Peçanha
Psicólogo formado pela UERJ, Mestre e Doutor em Psicologia pela UFRJ; Terapeuta cognitivo-comportamental; ex-diretor da Associação de Terapias Cognitivas do Rio de Janeiro; Diretor da Pareja.
- Beatriz de Oliveira Meneguelo Lobo
Psicóloga e Mestra em Psicologia (área de concentração Cognição Humana) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutoranda em Psicologia em Saúde e Desenvolvimento pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP), com bolsa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Especialista em Terapias Cognitivo-Comportamentais e com Formação em Terapia do Esquema. Pesquisadora e Supervisora no Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental - LaPICC-USP da Universidade de São Paulo (USP).