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Terapia cognitivo-comportamental (TCC): como funciona, evidências e como aplicar

Desenvolvida por Aaron T. Beck, nas décadas de 1960 e 1970 ​(J. S. Beck, 2022)​, a Terapia Cognitivo-comportamental (TCC) pode ser compreendida como uma “uma abordagem psicoterapêutica ativa, focada no problema e sensível ao tempo, que se concentra na mudança cognitiva e de comportamento e aceitação” ​(Wenzel, 2021, p. xvi)​.  

Nos últimos 50 anos, a TCC tem sido considerada um dos mais importantes progressos no tratamento de diversas condições psicopatológicas fundamentado por um extenso e consistente agrupamento de evidências da sua eficácia ​(Hofmann, 2021)​.

Além dos referidos achados apoiarem o estabelecimento da TCC como tratamento de primeira linha para transtornos mentais ​(Vrijsen et al., 2021)​, estudos também têm demonstrado que ela pode ser eficaz em proporcionar benefícios que podem prevenir ou reduzir a gravidade de episódios futuros ​(J. S. Beck, 2022)​.

Por exemplo, ​Fordham et al. (2021)​ examinou a consistência do efeito da TCC, e os resultados demonstraram a ocorrência de melhorias na qualidade de vida relacionada à saúde em pessoas com condições físicas (p. ex. dores abdominais, relacionadas à leucemia e torácicas inespecíficas e osteoartrite) e mentais (p. ex. ansiedade e depressão). Esses resultados foram mantidos após 12 meses de conclusão do tratamento. 

Princípios da terapia cognitivo-comportamental

De acordo com ​Dobson e Dobson (2010)​ três proposições, ou princípios, estão presentes em todos os tratamentos da terapia cognitivo-comportamental: 

  1. O conteúdo e o processo de nosso pensamento são passíveis de serem conhecidos.
    Os autores afirmam que para a teoria cognitiva, que embasa a TCC, é possível, com treinamento adequado e atenção, os indivíduos conseguirem acessar e identificar suas próprias cognições.  
  2. As cognições exercem a função de mediação entre as situações e as reações emocionais e comportamentais
    . O modo como os indivíduos constroem a realidade ou o modo como pensam os eventos vivenciados é central para a maneira como se sentem e se comportam. Portanto, há uma mediação cognitiva entre as situações e as respostas típicas das pessoas em tal acontecimento.  
  3. De forma intencional, os indivíduos podem modificar suas próprias cognições e a maneira pela qual respondem aos eventos
    . As pessoas podem se tornar mais funcionais e mais adaptados por meio da compreensão de nossas reações emocionais e comportamentais, assim como usar as estratégias cognitivas sistematicamente. 

O último princípio revela que a TCC utiliza uma variedade de técnicas para mudar o pensamento, o humor e o comportamento. Ao considerar a conceitualização cognitiva do caso, é possível selecionar um conjunto de técnicas e estratégias a fim promover a melhora do cliente, com a conquista dos objetivos da terapia ​(J. S. Beck, 2022)​.

A conceitualização cognitiva, também conhecida como formulação do caso, é definida por ​Kuyken et al. (2010)​ como um processo em que o terapeuta e o cliente trabalham de forma colaborativa para descrever e compreender os problemas que o último apresenta. Sinteticamente, seu papel é ser um guia para que a terapia alcance dois objetivos abrangentes: aliviar o sofrimento dos clientes e desenvolver a resiliência.  

Segundo ​Kuyken et al. (2010)​, existem três princípios orientadores da conceitualização cognitiva que possibilitam uma abordagem que é flexível, mas sistemática:

  • 1) níveis de conceitualização:
    a partir da descrição das dificuldades atuais do cliente, a conceitualização possui a finalidade de prover estruturas explanatórias que envolvem os fatores desencadeantes, ciclos de manutenção e/ou elementos predisponentes e protetores.;
  • 2) empirismo colaborativo:
    a conceitualização deve ser construída conjuntamente entre o terapeuta e o cliente, integrando a experiência do cliente com teoria e pesquisa apropriadas em um processo esclarecedor de formulação e testagem de hipóteses.
  • e 3) incorporação dos pontos fortes do cliente
    : é necessário identificar e incorporar os pontos fortes do cliente para que seja aplicado os recursos existentes às suas dificuldades atuais e para fortalecer a sua consciência, além de utilizar os pontos fortes para desenvolver a resiliência no cliente.

Existem algumas propostas de sistema de conceitualização na literatura. Uma dela foi a elaborada por ​Neufeld e Cavenage (2010)​, que embora não envolve um modelo novo de formulação de caso, consiste em uma sequência de sugestões que tem como objetivo ajudar os terapeutas, principalmente os que estão iniciando a carreira, a desenvolverem habilidades importantes para essa tarefa relevante no processo terapêutico. 

Estratégias e técnicas da terapia cognitivo-comportamental

Resumidamente, no que se refere às estratégias e técnicas, com base em ​A. T. Beck et al. (2017)​ e ​J. S. Beck (2022)​, algumas são características da TCC: 

  • Descoberta guiada
    permite que o paciente reconheça padrões disfuncionais estereotipados de interpretação. Esta pode assumir a forma de diálogo socrático, no qual o terapeuta faz questionamentos cognitivos para reunir dados e ajudar o cliente a observar níveis mais profundos de significado. 
  • Psicoeducação
    sobre processos cognitivos e modos de pensamentos, sentimentos e comportamento, assim como objetivos e necessidades normais. 
  • Registros e programação de atividades
    , que permitem a identificação retrospectiva e o planejamento prospectivo de mudanças, incluindo avaliação dos níveis básicos de ativação e direcionamento dos objetivos, bem como a satisfação com a produtividade diária. A programação de atividades possibilita para aumentar a eficácia pessoal em áreas como emoções positivas (domínio e prazer), independência (desenvolvimento de habilidades), relações sociais (intencionais, recíprocas) ou propósito (valores ou significados pessoais). 
  • Treinamento de relaxamento e técnicas de redirecionamento comportamental
    , para uso quando a ansiedade ou a preocupação aumentam durante os esforços para mudar. 
  • Ensaio comportamental, modelação e treinamento de assertividade
    para o desenvolvimento de habilidades para responder de maneira mais eficaz a situações desafiadoras ou estressantes. 
  • Exposição in vivo
    , organizada para que o terapeuta auxilie o paciente a confrontar um estímulo que tem a probabilidade de desencadear um esquema problemático e apoie o esforço de experimentar e responder efetivamente às cognições problemáticas. Alternativamente, a exposição imagética pode ser útil em situações específicas que sejam difíceis de organizar in vivo. 
  • Reenquadramento, engajamento em comportamento de valor e autotranquilização
    para promover a adoção de atividades prazerosas e autotranquilizadoras, exercícios de relaxamento ou de atenção plena (mindfulness). Por exemplo, o cliente pode ter um foco para uma tarefa atual, para sua experiência imediata, para seu corpo ou respiração, ou para suas aspirações e planejar trabalhar voltado para essas aspirações. Além disso, pode engajar em atividades valorosas que envolvem os propósitos da vida. 

De acordo com ​Wenzel (2021)​, atualmente, o campo contemporâneo da TCC tem sofrido forte influência do desenvolvimento de novos olhares acerca das psicoterapias. Em função disso, está incorporando compreensões e uso de estratégias e técnicas que engloba o contexto, função, aceitação e atenção plena.

Isso tem impactado positivamente na aplicação da abordagem psicoterapêutica em variadas populações clínicas e não clínicas, bem como em diversas modalidades e ambientes além do formato tradicional de psicoterapia individual ambulatorial. Incluem-se intervenções cognitivo-comportamentais mediadas pelas tecnologias de informação e comunicação, com foco na atenção primária, com foco para crianças e adolescentes, para população idosa e para minorias étnicas e culturais.

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SOBRE A EDITORA-CHEFE
 

Carmem Beatriz Neufeld.
Psicóloga. Pós-Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental – LaPICC-USP. Professora Associada do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. Presidente da Associação Latino-Americana de Psicoterapias Cognitivas - ALAPCO (2019-2022). Presidente da Associação de Ensino e Supervisão Baseados em Evidências - AESBE (2020-2023).